Como três brasileiros foram enganados pelo dono de um veleiro e acabaram presos

Como três brasileiros foram enganados pelo dono de um veleiro e acabaram presos

Em 2017, três jovens e inexperientes velejadores brasileiros (o gaúcho Daniel Guerra e os baianos Rodrigo e Daniel Dantas – que, apesar da mesma origem e sobrenome, não eram parentes) responderam ao anúncio de uma empresa internacional de transporte de barcos, que buscava marinheiros para ajudar a conduzir um veleiro inglês, de 72 pés de comprimento, o Rich Harvest, do Brasil para a Europa.

Na viagem, junto com os candidatos, iriam um comandante, também contratado, e o proprietário do barco, o inglês George Saul, mais conhecido como “Fox” – “Raposa”, em português.

Mas, na última hora, o dono do barco, Fox, não embarcou para a travessia.

Coube, então, apenas aos quatro tripulantes contratados (o comandante francês Oliver Thomas, mais os três brasileiros) conduzir o barco até a Europa, com uma quantidade inédita de cocaína escondida no fundo do casco, cuja existência, no entanto, eles desconheciam – algo simples de entender quando se conhecem os detalhes desta sórdida história.

Tudo começou um ano antes, em maio de 2016, quando o Rich Harvest foi levado, pelo próprio Fox, para um estaleiro em Salvador, na Bahia, para reformas.

A obra incluiu a construção de um grande reservatório no fundo do casco, que, de acordo com o que o dono do barco disse ao responsável pelo estaleiro, serviria para armazenar mais combustível.

Quando a obra ficou pronta, Foz navegou com o barco até a costa do Espírito Santo e ali, secretamente, abasteceu o tal tanque extra do barco, que ficava debaixo das camas, com acesso por meio de um alçapão tapado com cimento, com exatos 1 157 quilos de cocaína, acondicionados em 1 063 pacotes, e avaliados em mais de R$ 800 milhões.

Nesta mesma época, Fox publicou o tal anúncio, recrutando velejadores brasileiros para a travessia do Atlântico.

Daniel Guerra e os baianos Rodrigo e Daniel se candidataram na hora.

Eles queriam ganhar experiência em navegação, somar milhas náuticas no currículo e ainda realizar o sonho de atravessar um oceano navegando.

Os três foram rapidamente aceitos, bem como o comandante francês.

E o barco partiu, abarrotado de cocaína escondida no fundo do casco.

Em Natal, onde pararam para uma escala técnica, a ingênua tripulação do Rich Harvest recebeu a visita da Polícia Federal, que foi averiguar uma denúncia de que havia drogas escondidas no barco.

Durante uma manhã inteira, os agentes, com a ajuda de um cão farejador, vasculharam o interior do veleiro.

Mas nada encontraram.

Os brasileiros, que haviam ficado assustados com aquela vistoria, respiraram aliviados: se nem a polícia encontrara nada de errado no barco, não havia por que ficarem preocupados.

E seguiram viagem, rumo ao outro lado do Atlântico, com uma verdadeira fortuna em cocaína escondida bem debaixo dos seus pés.

A travessia, contudo, foi uma pavorosa sucessão de problemas mecânicos no velho barco.

O motor esfumaçava a cabine inteira, o gerador não ligava e até o telefone via satélite parou de funcionar.

Com o veleiro se desmantelando, e após constatar que estava em vias de perder também o leme, o comandante francês resolveu ignorar as instruções do dono do barco para que não fizessem nenhuma escala no caminho, e fez uma parada não prevista em Cabo Verde, na costa da África, para tentar consertar o barco.

Tal qual ocorrera em Natal, a polícia de Cabo Verde, também alertada de que poderia haver drogas escondidas no barco, foi vistoriá-lo.

E desta vez encontrou a cocaína, armazenada dentro do tal compartimento secreto.

O comandante francês e o brasileiro Daniel Guerra, que estavam no veleiro no instante de chegada da polícia, foram presos na hora, por tráfico internacional de entorpecentes. E os outros dois brasileiros, em seguida, pelo mesmo motivo.

Mas os quatro foram unânimes em afirmar que não sabiam da droga e que haviam sido enganados pelo dono do barco – que, a partir daí, sumiu de vista.

Eles foram ingênuos em continuar a bordo de um barco sabidamente investigado por tráfico de drogas, e faltou sagacidade para intuir que algo não cheirava bem naquela história.

Também foram imprudentes ao embarcar num veleiro em estado claramente precário, e, caso não tivessem parado em Cabo Verde, talvez, nem sobrevivessem àquela desastrosa travessia.

Ou seja, incorreram em muitos erros.

Mas sempre afirmaram total inocência no caso da cocaína escondida no barco.

Meses depois de serem presos, os três brasileiros e o francês foram julgados e condenados pela Justiça de Cabo Verde, mas em um julgamento repleto de falhas.

A começar pelo fato de que o juiz não quis ouvir as testemunhas de defesa dos brasileiros.

Também ignorou o inquérito da Polícia Federal Brasileira, que inocentava os quatro rapazes, e tampouco reconheceu a responsabilidade do dono do barco no episódio.

Os quatro foram encarcerados e assim ficaram por um ano e meio, enquanto o causador de tudo aquilo continuava solto, em algum lugar da Europa.

A pedido da Polícia Federal Brasileira, o dono do barco até chegou a ser preso, na Itália. Mas a burocracia brasileira deixou vencer o prazo da sua extradição para o país e ele foi solto.

E sumiu.

Já os brasileiros ficaram presos na cadeia de Cabo Verde até o início de 2019, quando, constrangido por todas as evidências, o mesmo juiz que mandou prendê-los, os soltou, alegando que haveria um novo julgamento – que não aconteceu.

Só então eles, os três jovens velejadores brasileiros puderam retornar ao Brasil, absolvidos de um crime que jamais cometeram.

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O injustiçado encantador de orcas selvagens

O injustiçado encantador de orcas selvagens

Oito anos atrás, quando o filme O Farol das Orcas foi lançado, o biólogo marinho argentino Roberto Bubas, que sempre preferiu ser chamado apenas de Beto, viu sua vida virar de cabeça para baixo.

De repente, aquele discreto e quase recluso fiscal de uma reserva marinha na Patagônia, sul da Argentina, que até então se dedicava a proteção e estudo comportamental de um grupo de orcas que frequentavam a área onde ele atuava, virou personagem de filme.

E sua vida foi parar nas telas do mundo inteiro.

Desde então, Beto Bubas perdeu não só a tranquilidade, como, também, a companhia das baleias que tanto amava.

Transferido para outro posto na região, mas um local onde as orcas não frequentam, Bubas, por muito pouco, não perdeu também o emprego, fruto da perseguição e ciumeira profissional que passou a ser vítima, desde que o filme foi lançado.

Hoje, aos 53 anos, mesmo sendo uma reconhecida autoridade no comportamento das orcas, Beto Bubas atua como simples guarda fauna na praia de El Doradillo, na Península Valdés, que, no entanto, não é frequentada por aqueles animais – uma contradição e o mesmo que um especialista em macacos ser mandado para trabalhar no Ártico.

“Prefiro não aparecer mais na mídia”, diz o dedicado biólogo, que passou quase metade da vida acompanhando bem de perto o grupo de orcas que frequentava o mar da reserva onde era o encarregado, e onde acontecia um fenômeno raro, que justamente o tornou famoso.

O que tornou Beto Bubas uma quase celebridade mesmo a contragosto foi um fenômeno natural que, até hoje, só acontece na praia onde ele atuava como fiscal, antes de ser transferido: a captura de filhotes de lobos e leões marinhos pelas orcas através de uma técnica de caça até então inédita.

Em vez de aguardar que as presas saiam da segurança da areia para atacá-las no mar, as orcas de Chubut desenvolveram a técnica de avançar fulminantemente em direção à praia, abocanhando os filhotes na beira d´água.

A estratégia exige extrema coordenação por parte das orcas, que precisam voltar para o mar antes que as marolas geradas pelo seu próprio avanço em direção a areia recuem, sob o risco de ficarem encalhadas.

E foi isso que Bubas passou a estudar – e documentar – quando assumiu o posto.

Mas o que nem ele nem ninguém imaginava era que essa proximidade acabaria por criar um vínculo inédito entre o biólogo e aquele grupo de orcas selvagens.

Com o tempo, Bubas foi ficando cada vez mais íntimo e aceito pelas orcas, animais que, embora inteligentíssimos, estão entre os mais poderosos e violentos dos mares.

Tanto que as orcas costumam ser chamadas de “baleias assassinas”, embora isso embuta um duplo erro.

Primeiro, porque elas não são baleias e sim parentes distantes dos golfinhos.

E segundo porque, longe de serem “assassinas”, tratam-se apenas de estupendos predadores.

Munido de uma gaita, que tocava na beira d´água, Bubas passou a se aproximar das orcas sempre que elas apareciam na praia.

Ao ouvirem o som do instrumento, os animais respondiam trazendo tufos de algas para a beira da praia, para que o biólogo os arremessasse de volta ao mar, como quem brinca com uma bola.

Logo, passaram a se deixar tocar por Bubas, que, com isso, se tornou o único homem a interagir dessa forma com orcas não domesticadas.

Com isso, ele passou a ter a oportunidade de estudar o comportamento daqueles temidos animais de maneira privilegiada.

Desta inédita proximidade, resultou um livro e um documentário mundial feito pela National Geographic, que acabaria por desencadear o filme que mudaria a vida do biólogo para sempre.

O filme O Farol das Orcas, ainda hoje disponível na Netflix, não trata apenas da incrível relação do biólogo argentino com aquele grupo de orcas, mas sim o improvável interesse que aquela amizade despertou em menino argentino autista surdo e mudo, chamado Agustin, que, até então, jamais havia demonstrado interesse por nada.

Levado pelos pais para ver de perto a relação entre Bubas e as orcas, Agustin passou uma temporada com o biólogo e, a partir de então, seu desenvolvimento social decolou.

Hoje, aos 31 anos, Agustin leva uma vida praticamente normal, tem namorada, usa a linguagem de sinais para se comunicar e é artista plástico.

A partir de outro livro escrito por Bubas sobre o caso do menino (e os poderes terapêuticos que as orcas, tal qual os golfinhos, exercem em crianças especiais), o diretor espanhol Gerardo Olivares resolveu filmar O Farol das Orcas, que teve o ator argentino Joaquín Furiel no papel do biólogo.

A relação de Beto Bubas com os animais de Chubut, que durou mais de 15 anos, também lhe rendeu o do apelido de “Encantador de Orcas”, título que ele nunca apreciou muito.

“Eram apenas oito orcas, cinco delas fêmeas, as quais cabiam a missão de ensinar seus filhotes a caçar lobos daquela maneira, o que não acontece em nenhuma outra praia do mundo. Se elas morressem, o ensinamento desse tipo de caça também acabaria, e era isso que eu queria proteger”, disse, certa vez, Bubas, ao explicar o motivo do seu relacionamento estreito com aqueles animais.

Hoje, ainda alheio a fama e recluso em sua função de monitorar outros animais que não mais aquelas orcas, o biólogo argentino Beto Bubas amarga outro sentimento: a simples saudade delas.

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As apavorantes “ondas loucas” oceânicas

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Na tarde do dia 1 de janeiro de 1995, pela primeira vez, uma onda oceânica com proporções fora de qualquer padrão foi registrada e testemunhada por várias pessoas ao mesmo tempo. O colosso de água chegou a 26 metros de altura (num dia em que o tamanho das ondulações...

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As apavorantes “ondas loucas” oceânicas

As apavorantes “ondas loucas” oceânicas

Na tarde do dia 1 de janeiro de 1995, pela primeira vez, uma onda oceânica com proporções fora de qualquer padrão foi registrada e testemunhada por várias pessoas ao mesmo tempo.

O colosso de água chegou a 26 metros de altura (num dia em que o tamanho das ondulações não passava dos 12 metros) e quase pôs abaixo a plataforma de petróleo Draupner, fincada no Mar do Norte, onde estavam as pessoas que as puderam testemunhar – e que só sobreviveram porque estavam abrigadas numa plataforma bem alta e não num simples navio.

Foi a primeira vez que se produziu uma prova irrefutável de que as ondas oceânicas anormais existiam de fato – porque, até então, nenhuma de suas vítimas sobrevivera para contar a história.

Batizada de “Onda do Ano Novo”, aquela muralha d’água do primeiro dia de 1995 gerou a classificação de um novo tipo de ondulação marítima, que até então a ciência relutava em admitir.

Não era um tsunami nem consequência de algum maremoto distante. Tampouco fazia parte de uma série de ondas do mesmo tamanho. Era uma onda solitária, mas absurdamente alta, em meio a outras menores. Quase uma anomalia da natureza.

Mas, depois daquele dia, os pesquisadores (que, até então, insistiam na tese de que as ondulações oceânicas seguem padrões lineares de tamanho, portanto, não poderiam variar tanto de uma onda para outra), começaram a descobrir que as ondas gigantes não eram tão anormais assim.

Embora não suficientemente estudadas até hoje, sabe-se que as “ondas loucas” (“freak waves”, em inglês, como são conhecidas estas ondulações solitárias e monstruosas que surgem eventualmente nos oceanos) são formadas pela “sucção” das ondas menores, o que além de crescê-las, aumenta sobremaneira o vão que as antecedem.

O resultado disso é o surgimento de uma espécie de “buraco” na água, seguido de uma descomunal parede líquida, quase tão vertical que chega a quebrar – feito uma onda de praia.

Mas o fenômeno só acontece em alto-mar e, aparentemente (já que a ciência ainda pouco sabe sobre as ondas gigantes), apenas em locais com situações especiais.

O Mar do Norte, entre a Irlanda e a Noruega, onde aconteceu o registro daquela Onda do Ano Novo, é um deles. Os mares da Antártica, também.

Mas em nenhum ponto do planeta o fenômeno é mais intenso do que na costa da África do Sul, o que explica o sumiço de tantos navios na região.

Ao longo do litoral sul-africano flui a Corrente das Agulhas, famosa por sua velocidade e mudanças climáticas abruptas. Em certas situações, ao se chocar com águas tempestuosas vindas da Antártica, a Corrente das Agulhas gera ondas absurdas. E algumas dessas ondulações ganham proporções fenomenais e viram “ondas loucas”.

Os cientistas estimam que a força de uma onda gigante pode chegar a 100 toneladas por m3 ou quase sete vezes mais do que podem suportar os navios, que são construídos para aguentar impactos de 15 toneladas por m2 de água batendo no casco. E como elas quebram feito ondas de praias, podem partir cascos ao meio, se desabarem em cima deles. São, portanto, quase uma sentença de morte para navios de pequeno e médio porte.

Hoje, na medida do possível, os navios tentam evitar navegar pelas zonas mais sujeitas ao surgimento das ondas gigantes. Mas, a verdade é que nunca se sabe quando – e onde – elas poderão surgir.

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