A cidade que adotou como símbolo os golfinhos que ajudam os pescadores

A cidade de Laguna, no litoral sul de Santa Catarina, é particularmente famosa pelo seu animado Carnaval, por ter servido para demarcar um dos extremos do histórico Tratado de Tordesilhas, entre Portugal e Espanha no passado, e por ter sido berço de Anita Garibaldi, mulher do revolucionário Giuseppe Garibaldi, com quem lutou pela independência do Sul do Brasil.

Mas o que realmente mais orgulha Laguna são os golfinhos (lá chamados de “botos”) que habitam o canal que liga a cidade ao mar.

E por um motivo especial: eles são os únicos do Brasil (e um dos poucos no mundo) que interagem intensivamente com os pescadores, ajudando-os a pescar.

O fenômeno acontece mais ou menos assim.

Quando os cardumes de peixes entram no canal, os botos os empurram para a margem, onde estão os pescadores, com suas redes.

Em seguida, dão um sinal com o corpo para os pescadores e ficam aguardando os arremessos das tarrafas sobre os peixes, porque sabem que assim será bem mais fácil capturar um ou outro para eles próprios.

Com as redes vindo por cima e pelos lados, só resta aos peixes tentar fugir por baixo delas – justamente onde ficam os golfinhos, esperando.

Eles também penetram por baixo das redes, abocanham os peixes, giram o corpo e caem fora, antes que as tarrafas desçam totalmente.

A cada tarrafada, cada boto captura, ao menos, um peixe. E os pescadores, quase sempre, vários.

É um trabalho conjunto, solidário e extraordinário, porque os dois lados saem ganhando. No Brasil, o canal de Laguna é o único local onde o fenômeno acontece.

“Ninguém ensinou os botos a fazerem isso”, explica o ex-pescador, hoje fotógrafo, Ronaldo Amboni, nascido e criado em Laguna. “Eles aprenderam sozinhos e foram passando essa técnica de pai para filho. Acho até que foram eles que nos ensinaram a pescar assim”, brinca.

Mesmo penetrando perigosamente debaixo das redes, nunca aconteceram acidentes com os botos de Laguna. Nenhum deles jamais ficou preso nas tarrafas dos pescadores, porque o sincronismo entre as duas partes é perfeito.

O trabalho de um depende do outro, e gera um formidável espetáculo de interação entre homens e animais, que há muito tempo virou a principal atração da cidade.

Tanto que, anos atrás, os botos foram declarados como Patrimônio Municipal da cidade. E passaram a ser protegidos por lei.

Hoje, imagens dos alegres cetáceos decoram quase tudo em Laguna e viraram símbolo informal da cidade.

Em Laguna, os “botos pescadores”, como são chamados os golfinhos na cidade, formam uma colônia com cerca de 50 animais, de três grupos familiares, dos quais mais da metade interage diariamente com os pescadores, ajudando-os a encherem suas redes.

A primeira lição que os filhotes recebem das mães é a de como ´trabalhar’ com os pescadores, porque isso garantirá a alimentação deles. No entanto, eles são animais livres, que vão para onde quiserem – mas preferem não sair do canal de Laguna, porque estão habituados a capturar peixes com a ajuda dos pescadores.

A estratégia de pesca dos golfinhos de Laguna muda conforme o dia.

Como são animais muito inteligentes e com grande capacidade de comunicação, eles combinam entre si como irão atacar os cardumes e avisam isso aos pescadores, através de movimentos na superfície.

Cada golfinho dá o aviso de maneira diferente e cabe aos pescadores interpretar os sinais e jogar a rede no instante certo.

Ao fazerem isso, produzem movimentos na água que mais parecem balés sincronizados.

E quando a sintonia é perfeita, o que geralmente acontece, é peixe na certa, tanto para eles quanto para os pescadores.

Em Laguna, ninguém precisa de parque aquático para ver um golfinho dando piruetas bem de perto. Por isso, viraram a principal atração da cidade.

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Nenhum carioca tem dúvidas de que o mar que banha a parte central da cidade do Rio de Janeiro é uma baía – a Baía de Guanabara.

Também nenhum morador de Brasília duvida que a imensa concentração de água que dá contornos ainda mais bonitos à capital do Brasil seja um lago – o Paranoá.

Já os habitantes de Porto Alegre não sabem ao certo como chamar o principal cartão-postal da cidade: o Guaíba – que para alguns é rio; para outros, lago.

E essa polêmica já dura décadas.

Começou ainda na colonização da região, mas tomou força quando, em 1982, o governo do estado do Rio Grande do Sul (mais tarde, também seguido pela prefeitura de Porto Alegre), decretou que o Guaíba deveria ser oficialmente chamado de lago nas escolas e documentos oficiais – mas não necessariamente nas ruas, onde para boa parte da população da capital gaúcha o Guaíba continuou sendo o que sempre foi: um rio.

Contudo, estimulados por argumentos tecnicamente convincentes (e outros bem mais discutíveis), parte dos moradores de Porto Alegre também aderiu ao novo topônimo.

E o movimento do rio que virou lago foi ganhando adeptos, até se transformar em mais uma das preferidas discussões entre os porto-alegrenses – que, além de se dividirem entre torcedores do Grêmio e do Internacional, passaram a ter outras duas correntes divergentes: a dos que defendem a tese de lago e os que se recusam a deixar de chamar o Guaíba de rio.

E, ao que tudo indica, tal qual gremistas e colorados, jamais se chegará a um consenso.

“O Guaíba é um lago, porque, entre outras características, não possui margens paralelas e mais de 80% de suas águas ficam retidas”, defende o geólogo Rualdo Menegat, criador do Atlas Ambiental de Porto Alegre, que já se acostumou a ser contestado.

“O Guaíba tem desnível e curso d´água, portanto, é um rio”, diz Pedro Pesce, comodoro do Clube dos Jangadeiros, uma das grandes entidade náutica da cidade.

“Sob o ponto de vista técnico, tenho que concordar com os dois lados”, argumenta, diplomaticamente, o ex-presidente da seccional gaúcha Instituto de Arquitetos do Brasil, Tiago Holzmann. “O Guaíba tem características das duas coisas. É um rio, mas, também, é um lago”, desconversa.

“Não é nem uma coisa nem outra”, garante o velejador Alexandre Paradeda, pondo ainda mais lenha no churrasco do rio que virou lago, ou do lago que sempre foi chamado de rio. “O Guaíba é um estuário, porque é formado por diversos rios que nele deságuam”.

E tome polêmica.

Diante do impasse, muitos propuseram chamá-lo apenas de “Guaíba”, sem “rio” nem “lago”, já que para os porto-alegrenses o quase mar de água doce (mas meio barrenta) que banha a capital gaúcha é quase um membro da família – além de Patrimônio Ambiental da cidade e um ícone tão onipresente na paisagem local quanto a cuia e o chimarrão.

Também houve quem propusesse um referendo popular, uma votação na qual os próprios porto-alegrenses decidiriam como chamar o velho Guaíba, que sempre foi sinônimo da própria cidade.

Mas, como os dois lados, de certa forma, têm razão, acabou virando apenas mais uma interminável discussão, que até hoje embala as rodas de chimarrão.

Bem mais do que uma tola discussão, a polêmica sobre como classificar aquele volume d´água que batizou a própria cidade (a capital gaúcha não se chama “Porto” Alegre por acaso…) esconde outros motivos, muito mais valiosos do que a simples mudança no topônimo do Guaíba.

Por trás da mudança oficial estariam – como sempre, aliás – interesses financeiros, já que, como lago, as restrições ambientais às construções nas margens do Guaíba, uma faixa ultra nobre da cidade, seriam menores e bem mais flexíveis.

Enquanto, nas margens dos rios, as restrições às construções chegam aos 500 metros das margens, nos lagos, elas não passam dos 30 metros.

Daí o interesse na reclassificação do Guaíba – ficaria bem mais fácil erguer obras nas margens do rio que oficialmente passou a ser um lago.

A questão, portanto, não seria apenas de semântica, nem um blá-blá-blá à toa.

Havia grandes interesses envolvidos na mudança.

E é por isso que, até hoje, os porto-alegrenses não sabem ao certo se têm um rio ou um lago.

“A mudança oficial não teve nenhum valor prático, já que o Guaíba continua sendo o que sempre foi. Mas, financeiro, sim. E muito”, explica o advogado gaúcho Ottomar Ellwanger Júnior, que, nas horas vagas, gosta de navegar no que ele, bem como a maioria dos moradores de Porto Alegre, segue chamando de rio. “O motivo da mudança não foi científico. Foi comercial”, resume.

Como argumento para a mudança, o governo gaúcho se baseou em levantamentos técnicos sobre depósitos sedimentares, correntes contrárias e outros aspectos geográficos.

Em seguida, livros escolares foram alterados e as crianças passaram a aprender que seus pais, avós e bisavós sempre estiveram errados: o correto passou a ser chamar o rio de Lago Guaíba.

Só que boa parte dos porto-alegrenses jamais concordou com isso e continuou se referindo ao Guaíba pelo topônimo pelo qual ele sempre foi conhecido – uma canetada não poderia alterar a geografia.

A mudança, além de revoltar os porto-alegrenses mais conservadores (bem como os torcedores colorados – como passar a chamar o estádio Beira-Rio de “Beira-Lago”?), foi solenemente ignorada pelos que sempre consideram o Guaíba um rio, e – bah! – não se fala mais nisso!

Segundo a lógica reinante, o Guaíba só seria um lago se não houvesse uma saída para a Lagoa do Patos, que, por sinal, há quem defenda ser uma “laguna”, já que escoa para o mar – mas isso já é outra polêmica.

“A Lagoa dos Patos também tem entrada e saída de água e não é um rio. Então, porque o Guaíba não pode ser um lago?”, argumentam os defensores da tese de que o célebre rio gaúcho sempre foi chamado de forma errada.

Tempos atrás, até a Marinha do Brasil passou uma saia justa danada ao apresentar aos navegadores da cidade uma nova carta náutica do “Lago” Guaíba.

“Não é lago”, corrigiram os donos de barcos, na cerimônia. “É rio! Lago é uma porção de água cercada de terra por todos os lados e o Guaíba não é assim”.

O oficial encarregado da apresentação ficou sem saber o que dizer.

No festival de teorias, muitos porto-alegrenses preferiram não tomar partido. .

“Ninguém vai deixar de frequentar o Guaíba, ou de admirar com o seu pôr-do-sol magnífico, se ele for lago ou rio”, analisa o empresário gaúcho Waldemar Beer. “Guaíba já diz tudo”, resume.

Já uma professora gaúcha achou uma saída original e divertida para a questão: passou a dizer aos alunos que “o nome do lago é Rio Guaíba” – e agradou os dois lados.

Na duplicidade de opiniões, nem a própria definição da palavra indígena “Guaíba” (“encontro das águas”, em tupi guarani), ajuda, porque serviria para os dois casos.

Também historicamente, o Guaíba já foi grafado como rio e como lago nos antigos mapas.

E assim, quase quatro décadas depois da polêmica (mas tecnicamente embasada) canetada que oficializou a mudança, a dúvida continua.

Rio ou lago?

O que, afinal, é o Guaíba?

 

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No final da década de 1970, o Brasil ainda vivia resquícios dos anos de chumbo da ditadura militar e praticamente desconhecia a expressão “crime ambiental”.

Foi nesse período que estas duas situações (ditadura e meio ambiente) se encontraram, depois que um estranho caso, nunca oficialmente explicado, aconteceu na Praia do Hermenegildo, no litoral do Rio Grande do Sul, em 31 de março de 1978.

Naquela data, quatro dias após uma violenta ressaca atingir a costa uruguaia e todo o litoral do extremo sul do Brasil, a Praia do Hermenegildo, no município de Santa Vitória do Palmar, praticamente na fronteira com o Uruguai, amanheceu com um forte cheiro vindo do mar e uma quantidade impressionante de peixes mortos.

Até cachorros e cavalos, que estavam na beira da praia, ficaram intoxicados.

A população local se assustou.

Mas, para as autoridades, tudo não passava de um fenômeno natural chamado “Maré Vermelha” – uma proliferação exagerada de algas marinhas, que libera toxinas e “sufoca” o mar, gerando mortandade de peixes, além de tingir as águas com um tom avermelhado.

O fenômeno já havia acontecido na região. Mas não com aquela intensidade.

Naquela manhã, as águas da Praia do Hermenegildo pareciam cobertas por uma película avermelhada, que desprendia fortes odores e dificultava a respiração das pessoas.

Estudiosos e alguns precursores do ambientalismo brasileiro começaram a chegar ao litoral gaúcho, para analisar o caso.

E um deles resolveu investigar a fundo a questão. Mas em outro sentido.

O historiador local Péricles Azambuja desconfiou que aquilo que estava acontecendo na praia poderia ser consequência de um vazamento de produtos químicos de algum navio em alto mar e resolveu checar.

Também conferiu os naufrágios recentes na região.

E foi assim que ele chegou ao Taquari, um cargueiro do Lloyd Brasileiro que deixara o porto do Rio de Janeiro com destino a Montevidéu, em 1971, levando uma carga de “produtos químicos” não especificados, da empresa Dow Química.

Ao atingir a região do Cabo Apolônio, na costa uruguaia, mas a apenas cerca de apenas 100 quilômetros da Praia do Hermenegildo, o Taquari encalhou e foi abandonado, com sua carga nos porões.

Apesar do incidente ter acontecido sete anos antes, havia um detalhe intrigante também revelado pela pesquisa do historiador: durante aquela mesma ressaca que atingira a Praia do Hermenegildo, dias antes de o mar se tornar quase tóxico, o casco do Taquari havia se partido em dois e despejando seu misterioso conteúdo no vizinho mar uruguaio.

Coincidência?

Não para o pesquisador, que começou a defender a tese de que o que havia acontecido naquela praia gaúcha não era um fenômeno natural e sim consequência do derramamento da suspeita carga do navio brasileiro abandonado na costa uruguaia.

Ao tomarem conhecimento do fato, outros pesquisadores aderiram a tese de que as correntes marinhas poderiam ter levado resíduos da misteriosa carga do Taquari até aquela praia.

Começou uma pressão para que a empresa dona da carga do navio, a poderosa multinacional Dow Química, divulgasse o que ele transportava.

A empresa negou categoricamente que a carga do Taquari fosse tóxica, mas estranhamente pediu que eventuais barris que fossem dar nas praias não fossem abertos.

O que eles continham?

Jamais se soube.

Até porque nenhum deles foi recuperado inteiro.

As suspeitas aumentaram ainda mais quando alguém lembrou que o então todo poderoso ministro da Casa Civil, general Golbery do Couto e Silva, era um ex-diretor da Dow Química, justamente na época em que o Taquari encalhara, o que poderia explicar a insistência do governo brasileiro em atribuir a culpa pelo que acontecera na Praia do Hermenegildo a um simples fenômeno natural, em vez de analisá-lo com mais profundidade.

Na época, ainda sob fortes resquícios militares no país, os ambientalistas não tinham nenhuma voz ativa, nem sequer o termo “ecologia” era conhecido.

Por isso, o governo limitou-se a emitir um documento, batizado de “Livro Branco”, no qual reafirmava que tudo não passara de uma ação da natureza.

Embora altamente questionável, foi a primeira vez que o governo brasileiro deu alguma satisfação a povo sobre algo ligado ao meio ambiente.

Contudo, dez anos depois, ainda insatisfeita com aquela versão oficial para o que ficou conhecido como o “Caso do Hermenegildo”, a Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul promoveu uma série de debates a respeito do tema.

Ouviu políticos, moradores do Hermenegildo e ambientalistas, então já reconhecidos como tal, e concluiu que houve mesmo um fenômeno natural naquela praia, naquele dia, como demonstraram claros indícios da chamada Maré Vermelha.

Mas concomitantemente ao vazamento do que quer que houvesse dentro do casco rompido do navio – uma perversa coincidência, já que um fenômeno natural acabou servindo para ocultar e mascarar um crime ambiental.

O governo, então, respirou aliviado.

Mas, a mesma sorte não tiveram os peixes e os animais da Praia do Hermenegildo naquele dia.

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O supernadador que atravessou a nado o maior lixão dos mares

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Em dezembro de 2018, o nadador francês naturalizado americano Ben Lecomte, então com 51 anos, precisou desistir da inédita travessia que vinha fazendo do Oceano Pacífico a nado por um problema que não teve nada a ver com sua capacidade para encarar aquele desafio monumental: seu barco de apoio quebrou e a travessia teve que ser abortada, quando ele já havia cumprido dois terços do caminho entre o Japão e a costa oeste americana, e se aproximava do Havaí.

Na ocasião, apesar da decepção, o nadador não saiu da água totalmente frustrado, porque um novo projeto brotara em sua mente justamente enquanto ele nadava: voltar a nadar no Pacífico, mas numa área específica: a da maior concentração de lixo plástico do mundo, que fica entre o Havaí e o continente americano.

“Enquanto eu nadava, vi tanto plástico no mar que conclui que a melhor maneira de ajudar a chamar a atenção das pessoas para a gravidade desse problema seria atravessar o maior lixão oceânico do planeta nadando”, disse o nadador, ao apresentar o seu novo projeto.

E foi o que Lecomte fez.

Em 14 de junho do ano passado, ele partiu do mesmo ponto onde terminara precipitadamente sua épica jornada anterior, com o objetivo de atravessar a nado a área que é tida como a de maior concentração de lixo e resíduos plásticos de todos os mares do mundo.

Lecomte quis sentir o problema, literalmente, na pele.

“Cansei de esbarrar em coisas plásticas na superfície e ver grandes emaranhados de redes de pesca abandonados no meio do mar”, contou Lecomte ao dar por encerrada a bisonha travessia, que foi acompanhada de perto pelo veleiro Icebreaker, com dez voluntários a bordo.

“Nossa missão não era recolher o lixo, porque para isso seriam necessários gigantescos navios, mas sim apenas tentar mensurar o problema, através de medições da quantidade de micropartículas de plásticos a cada captura que fazíamos com uma espécie de rede que levamos no barco”, explicou o nadador.

Entre outros absurdos, Lecomte encontrou milhares de escovas de dente e palitos de cotonete usados no meio do oceano, incontáveis tampinhas de garrafas, um cesto de lavanderia coberto de cracas (sinal de que estava no mar há muitos anos), diversas boias desgarradas e uma centena de redes de pesca abandonadas, as chamadas “redes fantasmas”, que, mesmo desativadas, continuam capturando peixes e demais seres marinhos para sempre.

Logo no primeiro dia, quando Lecomte ainda nadava em águas havaianas, a captura de amostra da água revelou 95 partículas de microplásticos em apenas meia hora de coleta, número que, depois, subiria para perto de 500 partículas, na parte mais crítica do chamado “Lixão do Pacífico”.

Segundo pesquisadores, a cada ano, cerca de oito milhões de toneladas de lixo plástico vão parar no Oceano Pacífico, levados pelos rios, que, por sua vez, recebem lixo urbano.

E o que é visto boiando na superfície representa apenas 1% disso.

“99% dos resíduos plásticos que poluem os mares estão submersos ou transformados em micropartículas, que se tornam fatais para os seres marinhos ao serem ingeridas”, diz o cientista ambiental Markus Eriksen. “O que vemos na superfície é só a pontinha do iceberg”.

Dados ainda mais catastróficos estimam que, atualmente, já exista perto de dois trilhões de artefatos de lixo plástico nos oceanos, ou 250 unidades para cada habitante do planeta.

A razão pela qual essa monumental quantidade de plástico se concentra naquele ponto específico do Pacífico tem a ver com as correntes marítimas.

Naquele ponto do maior oceano do planeta, diversas correntes se encontram e ficam dando voltas sem parar, o que é chamado de Giro do Pacífico, uma espécie de corrente marítima circular.

Por conta dessa característica, aquela parte do Pacífico virou uma espécie de ralo, concentrando a sujeira do oceano, sobretudo o plástico, que leva décadas para começar a se degradar na água.

Uma garrafa de plástico lançada ao mar na costa da Califórnia irá chegar ao litoral do Japão, do outro lado do Pacífico, num prazo estimado entre três e cinco anos. E após outro período igual a esse, retornará ao mesmo ponto, dando início a um novo giro. E assim indefinidamente.

Por ficar eternamente girando no oceano, o ciclo do lixo no Pacífico jamais termina. E o plástico, que compõe a grande maioria dele, praticamente também não. “O plástico foi feito para desafiar a natureza”, lamenta um ambientalista da equipe de Lecomte.

Esta perversa característica das correntes marítimas da região foi descoberta, por acaso, em 1990, quando um navio deixou cair um container com 65 000 pares de tênis no meio do Pacífico.

Embora o container tenha espalhado sua carga no mar, nenhum tênis jamais chegou à costa, por conta das correntes circulares. E estima-se que muitos deles estão lá até hoje.

Segundo a oceanógrafa Sarak Royer, da Universidade do Havaí, plásticos que foram parar no mar quando do início da popularização deste material, na década de 1950, ainda seguem boiando no Pacífico ou (o que é pior) transformados em micropartículas, com efeito letal para os seres marinhos.

“É como se o ar que respiramos estivesse impregnado de partículas toxicas”, compara a oceanógrafa. “É isso o que a humanidade está fazendo com os peixes, baleias e tartarugas, ao permitir que o lixo plástico chegue ao mar”.

“Na travessia a nado, coletamos dados para a criação do primeiro levantamento realmente prático da poluição marinha causada pelo plástico no maior lixão dos mares”, explicou Lecomte, que já tinha no currículo outras façanhas, como a travessia do Atlântico também a nado, em 1998.

Na ocasião, contudo, seu feito foi bastante questionado, porque, enquanto ele descansava no barco de apoio, a embarcação seguia navegando, o que não mais aconteceu na tentativa de travessia do Pacífico – que, por fim, acabou se transformou em uma mistura de aventura com experimento científico.

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