Os quatro Porsches brasileiros que foram parar no fundo do mar

Os quatro Porsches brasileiros que foram parar no fundo do mar

Em 12 de março de 2019, quando navegava a cerca de 150 milhas da costa da França, a caminho do Marrocos, o cargueiro italiano Grande America foi vítima de um incêndio incontrolável e afundou, após ser abandonado por sua tripulação de 27 pessoas – todas resgatadas em seguida no mar.

Teria sido apenas mais um de tantos desastres marítimos, não fosse a peculiaridade de uma parte da carga que aquele navio transportava: quatro automóveis Porsche GT2 RS zero quilômetro, veículos puro-sangue capazes de atingir 340 km/h, e avaliados, cada um, em cerca de R$ 2,5 milhões, uma vez que haviam sido encomendados por quatro compradores brasileiros.

A notícia de que aqueles quatro exclusivíssimos automóveis haviam sido engolidos pelo oceano e jaziam a mais de 4 000 metros de profundidade, deixou os seus proprietários transtornados e chocou os amantes de carros esportivos mundo afora.

Especialmente porque aquelas haviam sido as quatro últimas unidades do modelo produzidas pela fábrica alemã, que havia tirado o GT2 RS de linha um mês antes.

O fato chocou até o próprio fabricante, que tomou uma decisão inédita: em vez de apenas indenizar os compradores pela perda dos automóveis, como seria o habitual nesses casos, a Porsche decidiu reabrir a linha de montagem e produzir apenas mais quatro unidades do GT2 RS, a fim de entregá-las aos compradores brasileiros.

Com isso, não privou aqueles quatro clientes de terem um automóvel que, tecnicamente, não existia mais.

Três meses depois, quatro novíssimos Porsche GT2 RS desembarcaram no Brasil – mais do que nunca, os últimos de uma série que fez história, também pela forma inesperada como terminou.

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Foto:Joy Photography DIVULGAÇÃO

Duas faroleiras que fizeram história

Duas faroleiras que fizeram história

Mulheres que cuidam de faróis não são nenhuma novidade.

Desde o começo desse tipo de sinalização marítima, sempre houveram mulheres que se dedicaram a esse tipo de trabalho, difícil e solitário.

Mas a mais jovem faroleira que se tem notícia foi, também, uma heroína.

A americana Ida Lewis tinha apenas 16 anos de idade quando, em 1857, assumiu o controle do farol de Lime Rock, numa pequena ilha na entrada do porto de Newport, no estado de Rhode Island, após seu pai, o verdadeiro faroleiro, sofrer um derrame cerebral.

E nunca mais saiu da ilha.

Durante 52 anos, Ida manteve o posto de faroleira e promoveu uma série de salvamentos, sempre com pesados barcos a remo, que manejava com incrível habilidade.

Um deles, até lhe rendeu a Medalha de Honra do Congresso Americano e o título de A Mais Brava Mulher da America.

Por isso, quando Ida morreu, também de derrame, em 25 de outubro de 1911, todos os navios do porto de Newport apitaram seguidamente, em sua homenagem.

Ida Lewis se tornou uma lenda entre os navegantes americanos.

Tanto que o farol de Lime Rock, onde ela passou praticamente a vida inteira, foi rebatizado com o seu nome – bem como o elegante iate clube da cidade, que, todos os anos, relembra a interessante história da menina que cresceu em um farol e dele nunca mais se separou.

Outro caso mundialmente famoso foi a de uma também faroleira – e ainda mais heroína – inglesa, filha do responsável pelo farol da ilha Farne, na costa da Inglaterra.

Ela era apenas uma jovem de 20 anos quando, ao amanhecer do dia 7 de setembro de 1838, subiu ao topo da torre, como sempre fazia, e de lá avistou um barco afundando.

Era o vapor Forfarshire, que havia batido nas rochas na noite anterior, deixando muitas vítimas na água, quase todas já mortas, em um dia de mar especialmente agitado.

A jovem desceu em disparada, chamou pelo pai e embarcou com ele em um pequeno bote a remo, único meio de navegação que eles tinham.

Indo e vindo seguidamente entre a ilha e o naufrágio, pai e filha conseguiram salvar cinco pessoas, a despeito das grandes ondas que ameaçavam transformar eles próprios em náufragos.

A nobre atitude dos dois se espalhou entre os marinheiros e transformou sobretudo a jovem em uma heroína.

Até a Rainha Victoria ficou sabendo do feito e recompensou a família com uma soma em dinheiro, para ser usada na educação da generosa filha, que, por coincidência ou não, atendia pelo gracioso nome de Grace Darling – algo como “Graça Querida”.

Para os cinco sobreviventes do Forfarshire que ela ajudou a salvar, não poderia mesmo ter havido graça mais benvinda.

Por essas e outras, para todos os marinheiros ingleses do século 19, Grace Darling virou a “Heroína mais que querida”.

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O trágico sumiço do “barco dos meninos”

O trágico sumiço do “barco dos meninos”

Dois anos antes de a Segunda Guerra Mundial começar, a Alemanha comprou da Bélgica um grande barco a vela, de quatro mastros, para ser usado no treinamento de jovens cadetes para a sua marinha mercante.

Batizado de Admiral Karpfanger, ele fez sua primeira viagem em setembro de 1937, entre Hamburgo e a Austrália, com uma tripulação que incluia 40 jovens aprendizes de marinheiros, com idades entre 15 e 17 anos.

O objetivo era ensiná-los rapidamente as técnicas de navegação, porque, secretamente, Hitler já planejava a invasão de países vizinhos e sabia que precisaria de muitos novos oficiais para isso.

A viagem durou quatro meses de intensos treinamentos a bordo, mas transcorreu sem nenhum incidente.

Um mês depois de chegar a Austrália, em 8 de fevereiro de 1938, o Admiral Karpfanger iniciou a travessia de volta à Europa, optando desta vez pela rota mais curta, via Pacífico Sul e Cabo Horn, pois o objetivo era estar de volta à Alemanha antes de maio, a tempo de melhor preparar os cadetes para a guerra que se aproximava.

Mas o Admiral Karpfanger jamais chegou a lugar algum.

Desapareceu por completo, sem deixar nenhum vestígio, o que gerou uma comoção mundial por conta da jovem tripulação, a despeito da bandeira da Alemanha nazista no barco.

Jamais se soube sequer onde ele afundou nem por quê.

A hipótese mais provável é que o barco tenha colidido com um bloco de gelo nos mares antárticos e afundado sem ter como pedir socorro, porque a única coisa sabida é que o seu rádio apresentara problemas logo após partir da Austrália.

Isso ficou claro nas quatro únicas comunicações da embarcação com a base alemã em solo australiano.

A primeira aconteceu apenas três dias após a partida e comunicou que tudo corria bem a bordo.

A segunda, já repleta de chiados, foi bem mais difícil de entender.

A terceira, quase um mês depois, fez saber, com extrema dificuldade, que o barco se encontrava a cerca de 1 500 milhas ao sul da Nova Zelândia, o que indicava uma navegação bem lenta, possivelmente conta da rota escolhida, repleta de gelo e famosa pelo seu mar nada amistoso.

E o quarto e derradeiro contato pelo rádio aconteceu no dia 12 de março, quando mal deu para avisar ao segundo oficial do barco almão que o seu primeiro filho havia nascido.

Em seguida, o rádio emudeceu de vez. Foi a última vez que se teve notícias do Admiral Karpfanger.

Durante todo aquele mês de março, os familiares dos tripulantes, sobretudo os pais dos jovens cadetes, aguardaram, ansiosos, notícias sobre o avanço da viagem.

Mas a companhia dona do barco, a Hamburg-Amerika, não deu nenhum retorno, porque simplesmente não sabia onde o navio estava.

Só no início de abril a empresa emitiu um comunicado, dizendo que a razão do silêncio era, sem dúvida, devido a uma pane no rádio de bordo.

Também garantiu que nenhum outro barco reportara qualquer avistagem do Admiral Karpfanger porque, como o objetivo era treinar bem os garotos, ele navegava em uma área remota, de navegação mais árdua e não utilizada pelos navios comerciais.

Mas, com certeza, aquelas não eram as únicas verdades a respeito do barco alemão.

Naquelas alturas, o Admiral Karpfanger já devia ter virado tragédia.

Mas nada foi aventado aos familiares.

Só no início de maio, quando nenhum registro da passagem do barco pela ilha brasileira de Fernando de Noronha foi feito, como era hábito na época, é que os responsáveis pela Hamburg-Amerika começaram a ficar seriamente preocupados.

Consultados, outros barcos que vinham do Pacífico para a Europa reportaram muito gelo no mar nas imediações do Cabo Horn, o que fez acender o sinal de alerta na empresa.

Mesmo assim, nada foi dito aos parentes dos garotos que estavam a bordo e a companhia continuou se recusando a admitir que o Admiral Karpfanger pudesse ter afundado.

O mês de maio também passou sem nenhuma notícia do barco.

Só em julho, quando a pressão das famílias atingiu níveis insustentáveis, já que o Admiral Karpfanger deveria ter chegado a Hamburgo em maio, é que a Hamburg-Amerika resolveu agir.

Mandou que um dos seus navios fizesse a mesma rota do barco desaparecido e pediu ajuda aos governos do Chile e da Argentina nas buscas.

Diversos vestígios e restos de naufrágios foram encontrados.

Mas, aparentemente, nenhum deles era do barco que eles procuravam.

Agosto chegou e a única certeza sobre o Admiral Karpfanger era que ele havia mesmo desaparecido.

Mesmo assim, só em setembro a empresa emitiu um comunicado admitindo isso.

Apesar da iminência do avanço bélico nazista na Europa, o mundo inteiro se sensibilizou com o desaparecimento do barco dos garotos e mensagens de condolências foram enviadas tanto aos familiares quanto ao próprio governo alemão.

Em 21 de setembro, o nefasto sino do Lloyd’s tocou em Londres, oficializando a perda do Admiral Karpfanger e iniciando toda sorte de especulação sobre o que teria acontecido com ele.

Entre as hipóteses levantadas, uma delas pregava que, na ânsia de preparar bem os cadetes, o comandante do Admiral Karpfanger teria forçado demasiadamente o barco, fazendo-o navegar a todo pano numa região que exige cautela.

Outra especulava que o barco alemão poderia ter sido desviado para uma ilha remota do Pacífico, a fim de montar uma base secreta, já visando a guerra que se aproximava.

De todas as teorias, no entanto, a mais provável era mesmo o choque acidental com um bloco de gelo.

Nos meses seguintes, as buscas continuaram, mas sem nenhum resultado, exceto um intrigante pedaço de porta com uma placa de metal na qual se lia, em alemão, “Capitão e Oficiais”, encontrada numa das ilhas nas proximidades ao Cabo Horn – e que, segundo a empresa que reformara o Admiral Karpfanger antes da sua viagem bem poderia ser do barco desaparecido.

Mas ficou por isso mesmo.

Para os familiares daqueles 40 jovens só restou a dor da perda e a eterna dúvida: o que aconteceu com o barco dos garotos?

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A incrível saga dos patinhos navegadores

A incrível saga dos patinhos navegadores

Era uma vez um navio cargueiro, que, em janeiro de 1992, durante uma tempestade, deixou cair no mar um dos contêineres que transportava.

Até aí, nada demais.

Contêineres perdidos no mar são fatos quase corriqueiros nos oceanos.

Só que, naquela ocasião, ao cair na água, o contêiner se abriu e espalhou no mar a sua curiosa carga: quase 30 000 patinhos de borracha, desses usados para divertir as crianças nas banheiras, que haviam sido produzidos na China e estavam sendo levados para os Estados Unidos.

A lógica era que os patinhos logo virariam apenas mais um pouco de lixo no oceano.

Mas não foi bem o que aconteceu.

Como se tratavam de brinquedos feitos justamente para boiar, meses depois, alguns patinhos começaram a chegar a certas praias do Alasca, a mais de 3 000 quilômetros do local do incidente.

E, nos anos seguintes, passaram a pipocar, também, em partes bem mais distantes do globo, como a China e a Escócia.

Nascia assim a “caça aos patinhos navegantes”, brincadeira que, durante muitos anos, arregimentou pessoas no mundo inteiro.

Isso aconteceu porque aquele contêiner caiu num ponto específico do Pacífico onde duas correntes marítimas se encontram e cada uma prescreve um círculo completo, envolvendo mais de um continente.

Uma delas, chamada Giro Subártico, faz uma volta completa – e permanente – entre a América e a Ásia, além de unir-se a outra corrente que atravessa o Estreito de Behring, até o Atlântico, o que explicou o surgimento de patinhos também na Europa e na costa Leste americana, do outro lado do Pacífico.

Com base nisso, os cientistas perceberam que aquela inusitada tropa de patinhos de borracha era uma maneira eficaz de estudar as correntes marítimas e passaram a pedir que, quem os encontrasse, fizesse contato.

Ao mesmo tempo, ao notar que algumas pessoas estavam de fato empenhadas em coletar os tais patinhos, a empresa dona da carga, uma rede americana de lojas de artigos infantis, farejou uma oportunidade de ganhar visibilidade mundial e passou a oferecer 100 dólares de recompensa por cada brinquedo devolvido.

Com isso, a caça aos patinhos se transformou, também, em um modismo rentável.

Além do que colecioná-los tornou-se algo ainda mais desejado.

Quanto mais deteriorados os patinhos iam surgindo, mais passaram a valer para os colecionadores, porque isso significava que haviam ido mais longe ou que tinham ficado no mar mais que os outros.

O movimento gerou até um livro, o divertido Moby Duck (um trocadilho com Moby Dick), escrito por Donovan Holh, um dos primeiros colecionadores daqueles patinhos navegantes.

Durante cinco anos, Holh seguiu o rastro daqueles brinquedos errantes e estimou que alguns daqueles deles haviam navegado mais de 80 000 quilômetros, antes de desgarar das correntes marítimas e dar em alguma praia.

Quando isso acontecia, lá estava ele, tentando montar o quebra-cabecas de por onde aqueles singelos patinhos haviam passado.

Até o incidente com aquele contêiner, a ciência não sabia exatamente quanto tempo um objeto levava para completar o Giro Subártico.

Hoje, graças aos patinhos, sabe-se que é algo em torno dos três anos.

Mas, como as correntes são circulares e retornam sempre ao mesmo ponto, é bem provável que, mesmo hoje, quase 30 anos depois, alguns daqueles bravos bichinhos de borracha ainda estejam navegando, em algumas partes dos oceanos.

E ninguém sabe até quando ficarão fazendo isso.

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A escuna que só ficou visível por três dias

A escuna que só ficou visível por três dias

A tempestade que revirou as águas do Lago Michigan, no extremo norte do Estados Unidos, no dia 19 de abril de 2020, trouxe à tona a resposta a um mistério que já durava 117 anos: o paradeiro final da escuna R. Kanters, que desapareceu durante outra tempestade na região, 117 anos antes.

A tormenta remexeu o fundo de areia na beira do lago, na altura da pequena cidade de Holland, e fez aflorar parte do grande casco de madeira do barco que afundara em 7 de setembro de 1903.

No dia seguinte, ao caminhar pela margem do lago, um morador viu escombros brotando da areia e teve a feliz ideia de entrar em contado com a associação de pesquisadores de naufrágios da região – que imediatamente entrou em ação, porque aparições desse tipo, embora não raras no sempre agitado Lago Michigan, costumam ficar visíveis por pouquíssimo tempo, antes de serem novamente cobertas pela areia.

Mas havia um problema: era o auge do confinamento gerado pela pandemia do coronavírus, e os técnicos da entidade estavam impedidos de ir ao local para investigar e atestar a identidade do barco.

Alguma coisa, porém, tinha que ser feita, para não perder a chance de averiguar os restos do velho naufrágio sem sequer colocar os pés na água, já que eles estavam visíveis na própria areia da margem.

Como nenhum especialista podia ir até lá, a única saída foi transformar aquele simples morador em um quase arqueólogo, instruindo-o, através de mensagens no celular, sobre como registrar, medir e coletar informações que pudessem levar a identificação do naufrágio.

E rapidamente, antes que as areias cobrissem tudo novamente.

O homem, então, muniu-se de pás, câmeras e fitas métricas, e começou a vasculhar, sozinho, os escombros do barco, sob a orientação remota dos especialistas, que iam lhe passando instruções e pedindo coleta de imagens e medidas específicas, a fim de compará-las com antigos registros de naufrágios na região.

E tudo isso correndo contra o tempo, antes que lago engolisse de novo o barco.

Tinha tudo para dar errado, mas não deu.

Em pouco mais de um dia de trabalho, os técnicos, mesmo à distância, concluíram que se tratava do que restou da escuna R. Kanters, assim batizada em homenagem ao seu proprietário, Rokus Kanters, um ex-prefeito da própria cidade de Holland.

E a história do barco pode, finalmente, ser completada.

Mas nada dele foi coletado.

No dia seguinte, apenas três após ter emergido do fundo do lago, os restos da escuna voltaram a desaparecer sob as águas, e retornaram ao mesmo esconderijo onde ficaram por mais de um século.

Mas, agora, já identificados como sendo o que restou da R. Kanters, graças ao esforço de um leigo morador que virou arqueólogo.

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André Cavallari, leitorfoto: michiganshipwrecks.org