Que fim levou o barco dos garotos?

Dois anos antes de começar a Segunda Guerra Mundial, a Alemanha comprou da Bélgica um grande barco a vela, de quatro mastros, para ser usado no treinamento de jovens cadetes para a sua marinha mercante.

Batizado de Admiral Karpfanger, ele fez sua primeira viagem em setembro de 1937, entre Hamburgo e a Austrália, com uma tripulação que incluia 40 jovens aprendizes de marinheiros, com idades entre 15 e 17 anos.

O objetivo era ensiná-los rapidamente as técnicas de navegação, porque, secretamente, Hitler já planejava a invasão de países vizinhos e sabia que precisaria de muitos novos oficiais para isso.

A viagem durou quatro meses com intensos treinamentos a bordo, mas transcorreu sem nenhum incidente.

Um mês depois de chegar a Austrália, em 8 de fevereiro de 1938, o Admiral Karpfanger iniciou a travessia de volta a Europa, optando desta vez pela rota mais curta, via Pacífico Sul e Cabo Horn, no extremo sul da América do Sul, pois o objetivo era estar de volta a Alemanha antes de maio, a tempo de melhor preparar os cadetes para a guerra que se aproximava.

Mas o Admiral Karpfanger jamais chegou a lugar algum.

Desapareceu por completo, sem deixar nenhum vestígio, o que gerou uma comoção mundial por conta da jovem tripulação, a despeito da bandeira da Alemanha nazista do barco.

Jamais se soube sequer onde ele afundou nem por que.

A hipótese mais provável é que o Admiral Karpfanger tenha colidido com um bloco de gelo nos mares antárticos e naufragado sem ter como pedir socorro, porque a única coisa sabida é que o seu rádio apresentara problemas logo após partir da Austrália.

Isso ficou claro nas quatro únicas comunicações da embarcação com a base alemã em solo australiano.

A primeira aconteceu apenas três dias após a partida e comunicou que estava tudo bem a bordo.

A segunda, já repleta de chiados, foi bem mais difícil de entender.

A terceira, quase um mês depois, fez saber, com extrema dificuldade, que o barco se encontrava a cerca de 1 500 milhas ao sul da Nova Zelândia, o que indicava uma navegação bem lenta, possivelmente conta da rota escolhida, repleta de gelo e famosa pelo seu mar nada amistoso.

E o quarto e derradeiro contato pelo rádio aconteceu no dia 12 de março, quando mal deu para avisar ao segundo oficial do barco que o seu primeiro filho havia nascido, na Alemanha.

Em seguida, o rádio ficou mudo.

Foi a última vez que se teve notícias do Admiral Karpfanger.

Durante todo o mês de março, os familiares da tripulação a bordo aguardaram, ansiosos, notícias sobre o avanço da viagem.

Mas a companhia dona do barco, a Hamburg-Amerika, não deu nenhum retorno, porque simplesmente não sabia onde o navio estava.

Só no início de abril a empresa emitiu um comunicado, dizendo que a razão do silêncio era, sem dúvida, devido a uma pane no rádio de bordo.

Também garantiu que nenhum outro barco reportara qualquer avistagem do Admiral Karpfanger, porque, como o objetivo era treinar bem os garotos, ele navegava em uma área remota, de navegação mais árdua e não utilizada pelos navios comerciais.

Mas, com certeza, aquelas não eram as únicas verdades a respeito do barco alemão.

Naquelas alturas, o Admiral Karpfanger já devia ter virado tragédia.

Mas nada foi aventado aos familiares.

Só no início de maio, quando nenhum registro da passagem do barco pela ilha brasileira de Fernando de Noronha foi feito, como era hábito na época, é que os responsáveis pela Hamburg-Amerika começaram a ficar seriamente preocupados.

Consultados, outros barcos que vinham do Pacífico para a Europa reportaram muito gelo no mar nas imediações do Cabo Horn, o que fez acender o sinal de alerta na empresa.

Mesmo assim, nada foi dito aos familiares dos jovens cadetes que estavam a bordo e a companhia continuou se recusando a admitir que o Admiral Karpfanger pudesse ter naufragado.

O mês de maio também passou sem nenhuma notícia do barco.

Só em julho, quando a pressão das famílias atingiu níveis insustentáveis, já que o Admiral Karpfanger deveria ter chegado a Hamburgo em maio, é que a Hamburg-Amerika resolveu agir.

Mandou que um dos seus navios fizesse a mesma rota do barco desaparecido e pediu ajuda aos governos do Chile e da Argentina nas buscas.

Diversos vestígios e restos de naufrágios foram encontrados.

Mas, aparentemente, nenhum deles era do barco que eles procuravam.

Agosto chegou e a única certeza sobre o Admiral Karpfanger era que ele havia mesmo desaparecido.

Mesmo assim, só em setembro a empresa emitiu um comunicado admitindo isso.

Apesar da iminência do avanço bélico nazista na Europa, o mundo inteiro se sensibilizou com o desaparecimento do barco dos garotos e mensagens de condolências foram enviadas tanto aos familiares quanto ao próprio governo alemão.

Em 21 de setembro, o nefasto sino do Lloyd’s tocou em Londres, oficializando a perda do Admiral Karpfanger e iniciando toda sorte de especulação sobre o que teria acontecido com o barco.

Entre as hipóteses levantadas, uma delas pregava que, na ânsia de preparar bem os cadetes, o comandante do Admiral Karpfanger teria forçado demasiadamente o barco, que não teria suportado o esforço de navegar a todo pano numa região que exige cautela.

Outra especulava que o barco alemão poderia ter sido desviado para uma ilha remota do Pacífico, a fim de montar uma base secreta, já visando a guerra que se aproximava.

De todas as teorias, no entanto, a mais provável era mesmo o choque acidental com um bloco de gelo.

Nos meses seguintes, as buscas continuaram, mas sem nenhum vestígio do barco, exceto um intrigante pedaço de porta com uma placa de metal na qual se lia, em alemão, “Capitão e Oficiais”, encontrada numa das ilhas nas proximidades ao Cabo Horn – e que, segundo a empresa que reformara o Admiral Karpfanger antes da sua viagem inaugural sob a bandeira alemã, bem poderia ser dele. Mas ficou por isso mesmo.

Para os familiares daqueles 40 jovens só restou a dor da perda e a eterna dúvida: o que, afinal, aconteceu com o barco dos garotos?

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A grande vantagem de morar no mar, em tempos de coronavuris

Neste momento, enquanto alguns bilhões de pessoas no mundo inteiro estão confinadas em suas casas, privadas de se movimentarem e sentindo os desconfortos do isolamento social e a insegurança gerada pelo risco da contaminação pelo Covid-19, um grupo de brasileiros não mudou em praticamente nada a sua rotina.

Seguem livres para sair de casa e se divertem em torno dela, com a certeza e a tranquilidade de que, mesmo fazendo isso, não correm risco de contrair o vírus.

Porque o local onde eles vivem é praticamente imune ao avanço do coronavírus.

Eles moram no mar, onde, pela própria característica do ambiente e completa escassez de pessoas, o vírus não consegue se espalhar.

E suas casas são barcos, que podem, inclusive, mudar de lugar, se surgir algum risco de o vírus chegar até lá.

“Nesse momento, estamos mais seguros do que qualquer brasileiro que viva em terra firme”, diz, com explícito alívio, o paulista Wladimir Popoff, que mora com a mulher, Rosane, em um veleiro, que geralmente fica ancorado perto das ilhas desertas da região de Paraty.

“Aqui, onde estamos, não há nenhum outro ser humano num raio de cinco quilômetros. E, se a gente quiser, dá para mudar a nossa ´casa` para ainda mais longe”, diz Wladimir, que se sente especialmente aliviado porque, tanto ele quanto a mulher, que já passaram dos 60 anos de idade, fazem parte do chamado “grupo de risco“ do vírus.

“Estamos naturalmente protegidos pelo mar”, diz Wladimir. “Só lamentamos não poder trazer para cá também os nossos parentes idosos, porque o espaço no barco é limitado”.

“Quem mora em um barco está menos preocupado, porque sabe que, se precisar, tem como escapar das áreas de contaminação, levando a casa junto”, diz a ex-enfermeira Guta Favarato, que, junto com o marido, mora em um veleiro. “Basta levantar âncora e ir para um local mais seguro, pelo menos por um tempo”.

O mesmo alívio de Wladimir, Rosane e Guta está sendo sentido, neste momento, por todas as pessoas que resolveram trocar uma casa por um barco e a vida em terra firme pelo mar.

Como o também casal Alcides Falanghe e Tatiana Zanardi, que, dez anos atrás, trocaram um apartamento em São Paulo por um veleiro no Caribe, no qual hoje moram e ganham a vida, recebendo e levando turistas brasileiros para passear nas Ilhas Virgens Britânicas.

“Quem mora num barco já vive um tipo de isolamento natural, porque não há nem vizinhos assim tão perto. Portanto, para nós, não mudou nada. Exceto a preocupação com os familiares, no Brasil”, diz Alcides, que é mergulhador e segue sua rotina diária sem nenhum contratempo, inclusive mergulhando no mar em torno do seu barco-casa. “Temos sorte de estar nessa situação”, admite.

Mas, com base na experiência adquirida pela estreita convivência do casal no pequeno espaço de um barco, a mulher de Alcides, a chefe de cozinha Tatiana, tem um conselho a dar às famílias, que, por conta da recomendação dos órgãos de saúde, agora tenderão a ficar os próximos dias confinadas, dia e noite, dentro de casa.

“É preciso ficar atento, também, à saúde mental das pessoas, porque nem sempre é fácil dividir o mesmo espaço com mais gente, o tempo todo”, diz Tatiana, com a autoridade de quem vive nos poucos metros quadrados do seu barco com o marido, há uma década. “Depois de certo tempo, a convivência tão estreita – e, ainda por cima, obrigatória – tende a deteriorar as relações familiares”, adverte.

“O segredo é fazer do limão uma limonada, e aproveitar o confinamento para pôr o papo em dia com a família, por exemplo,” aconselha Tatiana. “Quando o espaço é limitado e precisa ser compartilhado, é preciso haver tolerância e bom humor, porque não existe a válvula de escape de ir para as ruas, por exemplo. Por isso, quem mora num barco não briga, porque não tem espaço nem para evitar encontrar o outro dentro de ‘casa'”, brinca.

“Quem vive cercado pelo mar está, por si só, afastado das demais pessoas, portanto com menos chances de contrair o vírus nesse momento”, diz outro veterano no assunto, o velejador ítalo-brasileiro Elio Somaschini, de 71 anos, que já morou durante anos em veleiros e, neste momento, está na França.

Mas, ele acrescente. “Cedo ou tarde, todos irão pegar esse vírus, porque vai virar mais um tipo de resfriado. Mesmo quem vive no mar. O negócio é tentar fazer o vírus se espalhar o mais lentamente possível, para dar tempo de surgirem remédios, e o organismo humano criar anticorpos. Poucos morrem de gripe hoje em dia, mas muitos já morreram no passado, quando também foi epidemia”, analisa o experiente navegador.

Quem também pensa dessa forma é o casal Adriano Plotzki e Aline Sena, que moram em um veleiro há cinco anos, e até criaram um canal no YouTube, o Hashtag Sal, dedicado a quem, como eles, tem o mar como endereço.

“A gente sabe que, em algum momento, o vírus vai chegar até nós, mesmo passando temporadas isolados no mar”, diz Aline. “Mas também sabemos que, por enquanto, durante essa pandemia, podemos nos afastar da costa e, ao mesmo tempo em que nos protegemos, ajudamos a não disseminar ainda mais o vírus entre as pessoas”, analisa.

“De certa forma, quem mora no mar já vive um tipo de confinamento voluntário”, completa Adriano.

Essa opinião é compartilhada por dez em cada dez pessoas que optaram por morar em um barco, em vez de uma casa.

“É nessas horas que a gente vê as vantagens de ser um pouco mais autossustentável”, avalia a gaúcha Gergia Spiandorello, que junto com o marido, Diego, também mora em um veleiro, que, no momento, está nas distantes ilhas da Polinésia Francesa.

“Nesse instante, o nosso barco é o melhor lugar do mundo onde poderíamos estar”, diz Georgia. “Ainda mais na Polinésia Francesa, que, de tão isolada, mais parece que está em outro planeta”.

E ela completa: “Quem mora em um barco já está acostumado a não ter muito contato com outras pessoas e a prever recursos para ficar muito tempo vivendo no mar. Portanto, um isolamento se torna bem menos complicado”.

“Só não saímos ainda do apartamento e mudamos para o barco, porque ele ainda não está cem por cento pronto. Mas, diante desse quadro, não descarto essa possibilidade”, diz o capixaba Felipe Tessarolo, que junto com a mulher, a bióloga Giovanna, comprou um pequeno veleiro, no final do ano passado, com planos em transformá-lo na nova casa da família, que incluiu um enteado.

O barco, que ele mesmo está reformando nas horas de folga, está ancorado bem diante de Vitória, onde eles moram, em um apartamento alugado. Mas, como fica no mar, e não nas ruas, é bem menos suscetível ao contato com o vírus. “É o nosso plano de fuga”, diz Felipe.

Mesmo quem não pode sair do barco está se sentindo mais protegido dentro dele. É o caso do casal também gaúcho Bruna Sobé e Jairo Machado, cujo veleiro, no qual moram há oito anos, está retido em uma marina de Ushuaia, na Argentina, que fechou todos os seus portos, no início da semana.

“Não podemos sair daqui, mas ainda é mil vezes melhor estar no barco do que na cidade, onde, inclusive, ninguém pode sair de casa. Estamos presos na marina, mas de certa forma aliviados, porque, como ela está fechada, ninguém chega até o nosso barco”.

“De certa forma, estamos ´ilhados`, mas, ainda assim, em bem melhor situação do que se estivéssemos trancados em um apartamento ou morando numa cidade”, completa a mineira Christina Amaral, cujo barco também está retido na mesma marina em Ushuaia.

Em melhor situação está quem ergueu velas e saiu para o mar, antes de os confinamentos nos portos de diversos países serem decretados.

Como aconteceu com a família brasileira Quaresma Gandelman, pai, mãe e filho, de 12 anos de idade, que moram no veleiro Plancton, e estão navegando com sua casa-móvel entre as ilhas do Caribe.

“Saímos da Martinica um dia antes de fecharem o porto e, agora, estamos avançando, bem devagar, rumo a qualquer outra ilha onde seja mais seguro ancorar”, explica Cecília Quaresma, que é professora formada e transformou o barco-casa da família também em escola, para que o filho Igor siga estudando durante a viagem.

“Estamos tranquilos por estarmos protegidos contra o vírus no mar, e por termos estoque de alimento para ficar meses no barco, se necessário”, diz Cecília, que brinca: “Aqui, nem a escola do Igor parou”.

Ela, no entanto, tem acompanhado as notícias pela internet e teme pelos seus familiares. “De vez em quando, também somos tomados pela ´pandemia do pânico´, mesmo sabendo que estamos seguros no barco”, admite.

Já outra família que vive a bordo de um veleiro, os argentinos Juan Dorda, Constanza Coll e o filho Ulisses, de apenas dois anos, que estão há meses ancorados na Ilha Grande, no litoral sul do Rio de Janeiro, onde a rotina de passeios diários pelas praias desertas da ilha não foi alterada, tem outra preocupação nesse momento, embora compartilhem da mesma sensação de segurança, justamente por morarem em um barco: Constanza está no sétimo mês de gravidez e o plano original era ter o bebê em um hospital da região.

“Mas, agora, com essa corrida aos hospitais, que tende a gerar o caos, estamos começando a achar que pode ser mais seguro ter o bebê no próprio barco, como já nos sugeriram fazer”, cogita Constanza.

Que completa: “Não quero que meu bebê nasça em um ambiente de risco. Sei que fazer um parto em um veleiro não é o ideal, mas, no mar, pelo menos não há vírus”.

O barco-escola que um casal montou para o filho, enquanto navegam no Caribe

O barco-escola que um casal montou para o filho, enquanto navegam no Caribe

Tal qual milhões de crianças brasileiras, o menino Igor Quaresma Gandelman, de 12 anos, recentemente voltou às aulas.

Mas sua escola é diferente de todas as outras, porque fica no próprio barco onde ele vive, com o pai e a mãe – que também é a sua professora.

Neste momento, a curiosa casa-escola flutuante de Igor está no Caribe, já que a família está fazendo uma longa viagem, de ilha em ilha.

Mas nem por isso ele deixará de ir à escola.

Porque ela vai junto com o barco, para onde ele for.

“O Igor nasceu e cresceu no nosso veleiro, que sempre foi a nossa casa. Então, nada mais natural do que também estudar nele, já que sou professora formada”, diz a mãe do garoto, Cecília Quaresma, de 47 anos, que se divide entre as funções de mãe, velejadora e professora no barco-casa da família, que neste instante está na Ilha de Grenada, no Caribe, a caminho de outras ilhas.

Quase todos os dias, sempre que as condições do mar permitem, Igor senta-se na cabine do barco, transformada em sala de aula, e aprende coisas durante cerca de duas horas.

O método de ensino é o mesmo das escolas que seguem a pedagogia Waldorf, que pratica o desenvolvimento físico, espiritual, intelectual e artístico dos alunos através de atividades muitas vezes lúdicas, como cantos, poesias e pinturas, na qual sua mãe é formada.

O método Waldorf, que não segue livros didáticos, também dá grande autonomia aos professores para determinar o currículo e metodologia de ensino aos alunos, o que, no caso de Igor, é um facilitador e tanto.

“Por morar num barco, o Igor vive situações que as crianças de escolas convencionais não conseguem experimentar”, analisa a mãe-professora, que, todas as manhãs, prepara cuidadosamente cada aula que irá dar, enquanto medita, olhando para o mar.

“A vida num barco é muito rica em experiências e a metodologia Waldorf consiste, basicamente, em despertar nas crianças o interesse em aprender, o que gera um casamento perfeito. Hoje, o Igor aprende mais no barco do que numa sala de aula convencional”, diz Cecília, que garante dormir tranquila quanto a educação do filho. “Até porque conheço bem a professora dele”, brinca.

As aulas a bordo começam com uma simples saudação de “bom dia”, diante de uma lousa adaptada na cabine do barco.

“A saudação formal é o divisor de águas para o Igor. Ela sinaliza que, dali em diante, não sou mais a mãe e sim a professora, e ele entende isso claramente. Mas o aprendizado continua mesmo quando a aula acaba, porque, como viajamos com o barco, ele vai aprendendo sobre geografia e diferentes culturas na prática, já que vive isso de fato”.

O pai de Igor, o ex-advogado Fábio Galdelman, de 46 anos, que 18 anos atrás largou tudo e foi viver no veleiro que ele construiu a duras penas (e que, depois, com o casamento com Cecília e o nascimento de Igor, virou a casa da família), também ajuda no aprendizado do filho, ministrando aulas de inglês, trabalhos manuais e navegação, “que ele já domina feito um adulto, porque vive isso desde pequenininho”, explica.

“Nossa dedicação ao aprendizado do Igor é total e integral, já que, de certa forma, ele ´mora` na própria escola”, diz a mãe-professora. “E é uma sala de aula de um só aluno, o que gera uma dedicação do professor e um poder de absorção muito maior”, analisa.

“Pela metodologia Waldorf, no próximo período, que será o sétimo ano, o Igor terá que aprender sobre a Era dos Descobrimentos, e, para isso, nada melhor do que estar num barco, certo?”, diz Cecília, que só se preocupa com a  ausência de outras crianças na “escola” do filho.

Para compensar isso, o casal organiza roteiros com diversas paradas, para que Igor tenha contato com crianças nos lugares por onde o barco passa. E, uma vez em terra firma, organizam muitos passeios e atividades, para estimular a socialização do menino, que diz adorar a vida que leva.

“Nós não queríamos esperar até que o Igor crescesse para poder viajar pelo mundo”, explica Cecília. “Ao contrário, queríamos que ele aprendesse coisas na prática desde pequeno, daí a decisão de sair navegando ainda durante o período escolar. De certa forma, viajamos por causa dele, embora isso faça bem para todos nós, e mantenha a família ainda mais unida”.

O barco-casa-escola de Igor é um veleiro de pouco mais de 13 metros de comprimento, com três quartos, sala, cozinha e banheiro, com casco bem resistente e construído com capacidade para fazer longas viagens, como a que a família está fazendo agora.

Não há um roteiro rígido, mas o plano inicial é, após passar meses visitando as ilhas do Caribe, cruzar o oceano Atlântico até a Europa, para, depois, retornar ao Brasil, “talvez no final do ano que vem, se o dinheiro aguentar até lá”, diz o casal, que, para se manter, leva turistas para passear no seu barco nos lugares por onde passa, atividade que no meio náutico é conhecida como “charter”, e faz pequenos serviços de manutenção e reparos em outros barcos.

“A gente se vira para ganhar algum dinheiro, mas, ao menos, não gastamos com escola e ainda sabemos que o Igor está tendo um bom aprendizado”, diz Cecília, que se diz “totalmente tranquila” quanto a educação do filho. “O que ele aprende nas aulas no barco é acima do que aprenderia numa escola convencional”, garante.

Os Gandelman não são a única família com filhos pequenos que optaram por morar num barco – embora o mais comum sejam casais viverem dessa forma.

Mas, no Brasil, talvez sejam os únicos a montarem uma escola de fato a bordo de um barco. Uma escola sem uniforme, mas com metodologia e professora habilitada para isso.

“O Igor está tendo um ótimo aprendizado e isso, no futuro, vai render grandes frutos”, garante a mãe-professora-navegadora Cecília.

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A mais estranha das garrafas com mensagens lançadas ao mar

A mais estranha das garrafas com mensagens lançadas ao mar

Mesmo nos dias de hoje, garrafas lançadas ao mar com mensagens dentro delas não são nada raras.

Quase sempre as mensagens resumem-se a simples saudações e o inevitável pedido de contato para quem a encontrar, como uma forma primitiva de Facebook.

Mas nada se compara ao que havia na garrafa que a policial americana Paula Pendleton encontrou numa praia da Flórida, nos Estados Unidos, em setembro de 2019.

Dentro dela, havia um punhado de cinzas de um corpo humano, acompanhada de um bilhete, que explicava o macabro conteúdo da garrafa.

“Esta garrafa contém as cinzas do meu filho Brian, que morreu inesperadamente no dia 9 de março de 2019. Ele sonhava viajar pelo mundo. Então, eu o envio para a sua última aventura”, dizia a mensagem, assinada pela americana Darlene Mullins, mãe do jovem finado.

Aquela história havia começado dias antes, quando Darlene, junto com a neta Peyton, de 14 anos, filha de Brian, decidiu dar um destino incomum a uma parte das cinzas do corpo do filho, morto de ataque cardíaco quando tinha apenas 39 anos.

Ela separou alguns grãos das cinzas para pôr num pingente no colar que sempre usava, e colocou outro punhado na garrafa, juntamente com o bilhete e quatro cédulas de um dólar, “para pagar a despesa telefônica de quem a encontrasse”, pedindo que, além de um contato, a garrafa fosse novamente lançada ao mar, “para seguir sua viagem”.

Pois foi o que fez a policial Paula Pendleton.

Depois de ligar para Darlene e relatar o achado, ela convenceu o capitão de um barco a levar a garrafa até quase o meio do Golfo do México e lá, novamente, depositá-la no mar.

“Meu filho Brian sempre quis conhecer o mundo, mas jamais saiu de nossa pequena cidade, no Texas. Ele, agora, fará isso por um prazo indeterminado”, explicou Darlene, que até pensou em usar uma garrafa plástica, para evitar que ela quebrasse em eventuais choques com rochas ou navios, mas mudou de ideia, para “não poluir o mar”.

Assim sendo, é bem possível que os restos mortais de Brian Mullins estejam navegando até hoje, em algum ponto do Atlântico.

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Noivado e casamento no mar: o jovem casal brasileiro que mora e ganha a vida num veleiro

Sete anos atrás, os paulistas Priscila Lima Silva e Cláudio Diniz se conheceram e começaram a namorar.

Ele era dono de uma pequena confecção e ela trabalhava num escritório, ambos em São Paulo.

Mas a vida corrida e complicada da metrópole não agradava nenhum dos dois.

Foi quando Claudio, que havia sido criado em estreita sintonia com o mar, propôs a namorada que juntassem as economias, comprassem um veleiro e fossem morar nele, tal qual costumava ver na internet o que outros casais haviam feito.

Para surpresa dele, Priscila, que nada sabia sobre barcos e até enjoava com facilidade, topou na hora.

“Sempre gostei de viajar e a ideia de morar numa ´casa´ capaz de se movimentar me agradou, embora eu nunca tivesse pensado em viver num barco”, lembra Priscila, que, até então, levava uma típica vida de jovem assalariada de classe média, em São Paulo.

E assim eles fizeram. Três anos atrás.

Ainda como namorados, Priscila, hoje com 37 anos, e Claudio, com 42, foram viver a bordo do veleiro Beijupirá III, um espaçoso barco com casco de madeira, construído 15 anos atrás, que eles compraram com o dinheiro que haviam juntado.

E, no início de junho do ano passado, partiram, junto com outros veleiros, rumo ao Nordeste brasileiro.

Foi quando eles deixaram de ser namorados, para, durante a própria viagem, se tornarem noivos e, agora, casados – sem praticamente sair do barco.

O pedido de casamento aconteceu durante a escala do grupo no arquipélago dos Abrolhos, no litoral sul da Bahia, e pegou até a própria Priscila de surpresa.

“A gente havia convidado alguns amigos de outros barcos para beliscar no nosso, quando o Claudio, que não tinha me dito nada, fez o pedido, na frente de todo mundo. Foi uma grande surpresa, porque, como já morávamos juntos no barco, achei que jamais haveria casamento. Mas, depois, também houve. Em Fernando de Noronha”.

“Eu ia esperar chegarmos em Noronha para pedir a Priscila em casamento. Mas, na parada em Abrolhos, o astral da viagem estava tão legal, que resolvi antecipar”, explicou Claudio, emocionado. “Daí, em vez de noivar, resolvi casar na ilha e foi melhor ainda. Mas só conseguimos isso graças ao barco, que levou a gente até a ilha sem nenhum custo, já que veleiros são movidos pelo vento e vento é de graça”.

A cerimônia do casamento, bem simples e meramente simbólica, sequer teve padre. Uma amiga do casal disse apenas algumas palavras bonitas diante da capelinha da ilha (que, inclusive, estava fechada), e de um grupo de amigos que o casal fez desde que foram viver no mar.

Desde que decidiram mudar de vida e trocar o apartamento alugado em São Paulo por um veleiro usado em Paraty, Claudio e Priscila vivem do dinheiro que conseguem ganhar hospedando pessoas e as levando para velejar, negócio que, no meio náutico, é conhecido como “charter”.

A própria viagem para Noronha foi custeada pelos dez hóspedes que eles tiveram a bordo, durante a última Refeno, a famosa regata anual que acontece de Recife até a ilha.

“Somos uma espécie de pousada flutuante, com a vantagem de que ela se movimenta e a paisagem vai mudando para os hóspedes. Sem falar que a piscina é gigantesca”, brinca Priscila, que acrescenta: “A gente faz tantos novos amigos com os charters, que, às vezes, nem parece trabalho”.

Quando não estão navegando, Priscila e Claudio ficam em Paraty, de onde partem os charters que eles vendem, a um preço médio de R$ 3 000 o fim de semana, para quatro pessoas.

“Agora, o nosso objetivo é juntar um dinheirinho para tentar subir com o barco até o Caribe”, diz Priscila.

“Viajar é bom demais e é melhor ainda quando a nossa casa vai junto”, completa.

Caiu do Naviu

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