por Jorge de Souza | abr 13, 2023
Acima de tudo, o velejador argentino Vito Dumas foi um sujeito ousado.
Entre outras proezas, entre 1942 e 1943 ele fez, sozinho, a primeira circum-navegação do planeta pelo paralelo 40 graus Sul, uma faixa oceânica abaixo de todos os continentes (exceto a Antártica) e dominada por temperaturas cruéis, mar sempre grosso e ventos tão violentos que ganharam o apelido (dado por ele próprio, por sinal) de “40 Bramadores” – porque “rugem” dia e noite.
Um roteiro, até então, considerado duro demais para ser tentado por algum velejador em solitário.
Mas não para Vito Dumas.
O argentino gastou 272 dias para cumprir aquela duríssima travessia, sobretudo porque o seu barco, o Lehg, iniciais de “Lucha, Entereza, Hombría e Grandeza” (“Luta, Integridade, Masculinidade e Grandeza”, em português), valores que precisou mesmo ter para completar a viagem, era tão espartano que não tinha sequer motor nem tanque para armazenar água doce.
Quando sentia sede, Dumas bebia água da chuva. Quando chovia – o que, felizmente, naquelas altas latitudes, era frequente.
O argentino tampouco tinha trajes apropriados para aquele frio intenso e permanente.
Para se aquecer, forrava as roupas com folhas de jornal.
Antes disso, ele só havia feito uma única travessia, já que sua entrada no mundo náutico aconteceu por puro acaso.
Dumas era um nadador de longos percursos, quando, em 1931, decidiu atravessar o Canal da Mancha a nado.
Mas, vencido pelo cansaço, desistiu antes de chegar à outra margem.
Envergonhado, decidiu que não voltaria para a Argentina de cabeça baixa.
Comprou, então, um veleiro ali mesmo, na Inglaterra, e embora nada soubesse sobre barcos e navegação, resolveu retornar velejando, o que significava atravessar nada menos que o Atlântico – o que ele fez com galhardia.
Quando chegou a Buenos Aires, Dumas já tinha tomado gosto em definitivo pelo mar e não mais pararia de navegar.
Mas sempre de maneira bem precária e quase nada planejada.
Dois anos depois daquela sua ousada, mas bem-sucedida, volta ao mundo pela parte de baixo do globo terrestre, Dumas partiu para uma nova jornada em solitário, a bordo do mesmo barco.
Desta vez, resolveu ir de Buenos Aires a Nova York.
Mas, como ele insistia em não ter um motor no seu barco (porque dizia que para um veleiro bastavam os ventos…), não conseguiu penetrar no Rio Hudson, que banha a maior cidade americana, por causa da forte correnteza contrária.
Ou seja, Dumas foi até a entrada de Nova York para então descobrir que não conseguiria chegar até ela.
Mas ele não se abateu com o imprevisto.
Ali mesmo, deu meia volta e tomou outro rumo, cruzando o Atlântico, até os Açores — onde também não conseguiu aportar, por conta da alternância de calmarias e ventos contrários.
Dos Açores, aproou, então, de volta a América do Sul e foi dar na costa do Ceará, depois de mais de 100 dias no mar, sem parar em lugar algum.
Dumas foi um navegador nato, que, na água, se sentia em casa.
Morreu em 1965, aos 65 anos, quando já era um herói na Argentina e uma lenda náutica mundial.
Dos quatro livros que escreveu, um deles em especial, “Os Quarenta Bramadores”, sobre aquela épica travessia nos confins do mundo, inspirou diversos navegadores a repetirem o seu feito, o que se tornou uma espécie de troféu no currículo de qualquer velejador.
Com aquela insensata travessia, Vito Dumas fez história.
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André Cavallari, leitor
por Jorge de Souza | abr 12, 2023
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, muitos ex-oficiais da Marinha Alemã foram viver em outros países, e refizeram suas vidas.
Foi o que também fez o ex-comandante de quatro submarinos nazistas U-boats, Herbert Werner – mas só depois de viver um purgatório nas mãos dos seus inimigos.
Primeiro, Werner foi capturado pelos ingleses e passou um bom tempo passando por interrogatórios diários severos, na Inglaterra.
Depois, foi entregue pelos ingleses aos franceses, que, entre outras punições, o obrigavam a dormir ao relento e a cantar a Marselhesa todas as manhãs.
Até que ele conseguiu fugir da cadeia, e, para escapar dos franceses, quase chegou a se alistar da Legião Estrangeira.
De volta à Alemanha, Werner não ficou muito tempo.
Em 1957, pediu – e conseguiu – cidadania americana, apesar de ter afundado seis navios Aliados durante os combates.
Herbert Werner foi, então, viver na Flórida, onde escreveu o livro Caixões de Ferro, considerado um dos melhores relatos já feitos sobre a insana vida dos marinheiros dentro dos U-boats
E ali ele morreu, em abril de 2013, como cidadão americano.
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por Jorge de Souza | abr 12, 2023
Os raros turistas que decidem atravessar o lago Tanganika, entre a Tanzânia, Burundi, Zâmbia e a República Democrática do Congo, no leste da África, costumam levar um susto quando vêem o barco no qual será feita aquela viagem.
Trata-se do MV Liemba, um arcaico navio a vapor construído em 1913 (portanto, 110 anos atrás), que combateu nas águas daquele mesmo lago, na Grande Guerra Mundial – a Primeira e não a Segunda.
É o único navio usado naquele conflito que ainda navega normalmente e, também, um dos mais antigos barcos de passageiros em atividade no mundo.
Mas o que torna o MV Liemba ainda mais interessante é a sua própria história.
Ele foi construído em pedaços na Alemanha, com o nome Goetzen, para ajudar a defender o leste africano, então dominado pelos alemães.
Mas só foi montado na distante Tanzânia, já que, como o lago Tanganika fica quase no meio do continente africano, não daria para chegar lá navegando.
O navio foi dividido em cerca de 5 000 caixas, que foram transportadas (primeiro de navio, depois de trem, num total de 14 000 quilômetros) da Europa até o coração da África, onde, finalmente, foi montado – feito um gigantesco Lego.
A montagem do Goetzen, que era equipado com quatro poderosos canhões, só ficou pronta em 1915, quando a Primeira Guerra já corria solta na Europa e ameaçava invadir os domínios alemães na África.
Mas logo o navio se transformou em uma espécie de barreira contra a penetração dos aliados naquela parte da África, porque não havia outro barco tão bem equipado na região.
Os ingleses, então, decidiram usar o mesmo expediente dos alemães e despacharam para o lago dois outros navios, igualmente desmontados.
Mas nem assim conseguiram derrotar o Goetzen, que seguiu garantindo a liderança alemã no coração da África.
Até que, já sem recursos para continuar se defendendo dos ataques cada vez mais violentos dos Aliados, os próprios alemães decidiram por um fim ao seu valioso navio: retiraram os quatro canhões que o equipavam e ordenaram que a própria tripulação do Goetzen o afundasse nas águas do Tanganika, para que ele não caísse nas mãos dos inimigos.
Durante oito anos, o navio ficou submerso.
Até que, com o fim dos combates, uma equipe inglesa resolveu resgatar o barco.
Inflaram centenas de barricas sobre o casco e fizeram o outrora mais poderoso navio de combate da África voltar à superfície.
Em seguida, doaram o navio ao governo da Tanzânia, que o rebatizou MV Liemba, e o colocou para fazer o transporte de cargas e pessoas, no próprio lago.
O que acontece até hoje, quase cem anos depois.
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por Jorge de Souza | mar 23, 2023
Era apenas o terceiro dia de uma jornada prevista para durar semanas, no mar que circunda a Inglaterra, quando a velejadora inglesa Hilary Lister passou mal, perdeu a respiração e sua cabeça pendeu, inconsciente, sobre o cockpit adaptado do barco no qual ela navegava.
Imediatamente, sua equipe de apoio, que navegava ao lado, abordou o barco da velejadora e iniciou um procedimento médico de urgência, a fim de reanimá-la.
A ação levou intermináveis segundos, até que Hilary abriu os olhos, voltou a encher os pulmões de ar e sorriu, satisfeita.
Porque ela estava onde mais gostava de estar – no mar, navegando com um veleiro especialmente construído para a façanha que pretendia realizar: a volta completa da grande ilha da Grã-Bretanha, algo que incontáveis velejadores já haviam feito, mas nenhum da maneira como ela vinha fazendo.
Porque Hilary era tetraplégica e só conseguia mover a cabeça.
Todos os comandos do veleiro eram executados por meio de canudos, que ela assoprava ou sugava, de acordo com o movimento pretendido de leme e vela, o que exigia um esforço pulmonar intenso – daí aquela parada respiratória, causada pelo esforço em fazer o barco se movimentar.
Mesmo assim, Hilary fazia questão de navegar sozinha no barco, a despeito de suas severas limitações físicas.
Se precisasse se mover, ela não conseguiria.
Se o barco virasse e caísse no mar, certamente morreria.
Ainda assim, o máximo que a jovem inglesa, então com 37 anos de idade, permitia, era o acompanhamento de um barco de apoio, no qual seguiam médico e enfermeiro, prontos para qualquer emergência.
Em outras duas ocasiões durante aquela mesma jornada, Hilary perderia os sentidos e teria que ser reanimada.
Mas seguiu navegando, até que completou a sua circum-navegação das Ilhas Britânicas, em agosto de 2009, feito que a levou a ser premiada naquele ano como uma das quatro maiores velejadoras do mundo, pela Federação Internacional de Vela.
Na ocasião, Hilary assombrou o mundo.
Antes disso, porém, ela já havia feito outras travessias igualmente extraordinárias para alguém que não conseguia mover braços nem pernas, e navegava com o corpo inerte, estirado sobre o convés.
A primeira foi a travessia – também em solitário no barco – do Canal da Mancha, entre a Inglaterra e a França, em agosto de 2005, ocasião em que chegou a fixar um mapa na ponta dos pés, a fim de visualizar a rota.
Dois anos depois, ela voltou ao mar e contornou, da mesma forma, toda a Ilha de Wight, um dos ícones náuticos da Inglaterra – e tornou-se, também, a primeira pessoa com tamanho grau de deficiência física a fazer isso.
O objetivo de Hilary ao executar suas impressionantes travessias era duplo: provar que mesmo pessoas com deficiências físicas severas eram capazes de realizar grandes feitos, e se sentir feliz pela liberdade de movimentos que não tinha no seu dia-a-dia, sempre presa a uma cama ou cadeira de rodas.
“Comandar meu próprio barco me trouxe uma sensação de liberdade que nunca pensei que teria de volta”, disse Hilary, ao final de sua primeira improvável travessia. “Isso, literalmente, salvou minha vida”.
A vida de Hilary Lister começou a definhar ainda menina, por volta dos 11 anos de idade, quando suas pernas passaram a sofrer dormências e perda de firmeza.
Mais tarde, o mesmo aconteceu com suas mãos e braços, para perplexidade dos médicos, que não sabiam ao certo o que ela tinha.
Só aos 17 anos de idade, Hilary foi diagnosticada com uma doença degenerativa rara: a distrofia reflexa.
Dez anos depois, ela já não tinha mais nenhuma mobilidade do pescoço para baixo – só conseguia mover a cabeça, os olhos e a boca.
A limitação extrema a levou a pensar em suicídio.
Certa vez, decidiu que tomaria uma overdose de medicamentos, para pôr um fim naquele sofrimento.
Foi quando um amigo a levou, de cadeira de rodas, para velejar em um lago perto de sua casa.
Aquilo mudou sua vida.
A recuperação da capacidade de se locomover sem depender de ninguém fez Hilary se apaixonar pelos barcos, e ela não sossegou mais enquanto não conseguiu um que ela mesmo pudesse comandar, sozinha.
A solução veio quando um projetista canadense conseguiu adaptar para um pequeno veleiro, de 20 pés de comprimento, o mesmo sistema de movimentação através de sopros de ar que ela usava para se locomover em sua cadeira de rodas.
Através de variações nas pressões do ar dentro de tubos que Hilary operava com a boca, microprocessadores eletrônicos eram capazes de controlar a movimentação do barco.
Um tubo gerenciava o leme; outro, a posição da vela.
E assim, soprando e sugando o ar, ela conseguia navegar, sem depender de mais ninguém a bordo.
“Se você multiplicar por mil a sensação de liberdade que todo mundo sente por poder dar um passo na direção que quiser, vai saber como eu me sinto agora”, disse Hilary, ao testar o barco pela primeira vez.
Em seguida, ela deu início às suas travessias, ao mesmo tempo em que criou uma instituição, a Dream Trust (algo como “Confiança no Sonho”), dedicada a ajudar pessoas com deficiências físicas a realizar seus desejos.
“Com as ferramentas certas, até grandes aventuras são possíveis”, explicou Hilary ao criar a entidade e partir para a maior de suas façanhas, a circum-navegação da Grã-Bretanha – aquela em que quase morreu em três ocasiões, por perda da consciência causada pelo esforço de mover um barco à vela apenas com o ar dos próprios pulmões.
Sua última travessia foi em 2014, quando cruzou o Mar da Arábia a bordo de um veleiro convencional, mas já na companhia de outras pessoas.
Em seguida, por conta de uma infecção permanente causada pela própria doença, a saúde de Hilary começou a definhar, e ela morreu, quatro anos depois, aos 46 anos de idade.
Deixou, no entanto, uma lição perene de vida e perseverança, na busca pela liberdade de movimentos, mesmo quando o corpo conspira contra isso.
De certa forma, Hilary Lister venceu até a medicina.
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por Jorge de Souza | mar 15, 2023
O verão carioca de 1988 foi marcado por um fato curioso, que fez a alegria de muitos freqüentadores das praias do Rio de Janeiro: a chegada, pelo mar, de latas cheias de maconha, no que ficou conhecido como o “Verão da Lata” – e virou até letra de música na época.
Tudo começou quando o pequeno barco cargueiro panamenho Solana Star partiu de Cingapura, com destino a Miami, em agosto de 1987, com uma carga de 22 toneladas de maconha disfarçada dentro de latas que imitavam alimentos em conservas.
Alertada pelo departamento anti-drogas dos EUA, que monitorava secretamente o avanço do barco, a Polícia Federal do Brasil entrou em ação e abordou o cargueiro, quando ele passava ao largo da cidade do Rio de Janeiro.
Mas, antes que isso acontecesse, com problemas mecânicos que fatalmente o obrigariam o barco a fazer uma escala não prevista no porto da cidade, a tripulação do Solana Star já havia atirado ao mar toda a sua carga proibida – para alegria especialmente dos surfistas, que viram chegar às praias cariocas latas e mais latas cheias de maconha, como se fossem presentes de Iemanjá.
Das cerca de 15 000 latas que o barco transportava, apenas pouco mais de 2 500 foram recuperadas pela Polícia nas praias cariocas.
As demais serviram para embalar animadas festas na cidade, além de transformar a expressão “Da lata” em sinônimo de coisa boa, já que a maconha transportada pelo barco era da mais alta qualidade.
Quando a polícia brasileira abordou o Solana Star, bem diante da cidade do Rio de Janeiro, nada mais encontrou a bordo.
Com isso, nem sua tripulação foi presa.
Só o barco foi confiscado, apesar dos protestos do armador, que dizia nada saber sobre a tal carga.
A euforia carioca com as latas de maconha do Solana Star durou meses, mas o destino do barco foi bem menos glorioso.
Retido durante dois anos pela Polícia e depois leiloado, ele virou barco de pesca e foi rebatizado Tunamar.
Mas adernou, emborcou e afundou logo na sua primeira viagem como barco pesqueiro, na altura de Arraial do Cabo, no litoral norte do Rio de Janeiro, ao que tudo indica por excesso de peso.
Depois de fazer a alegria dos maconheiros do Rio de Janeiro, o Tunamar (ex-Solana Star) hoje alegra os mergulhadores que o visitam no fundo mar, em busca de diversão e – quem sabe? – alguma lata esquecida no casco.
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por Jorge de Souza | mar 9, 2023
O norueguês Per (que todos chamavam de Peter) Tangvald nunca foi uma pessoa convencional.
Muito menos um velejador dentro dos padrões habituais.
Quando comprava um barco, por exemplo, a primeira coisa que fazia era retirar o motor e jogá-lo fora, porque dizia que motores acabavam com o romantismo dos veleiros – além de ocuparem espaço, serem barulhentos e extremamente fedorentos.
Também substituía o banheiro por um simples balde, porque pregava que ninguém deveria ter a bordo algo que não pudesse consertar com facilidade – e privadas eram uma permanente fonte de problemas para ele.
Para Peter Tangvald, não fazia sentido ter em um veleiro nada além do que os antigos barcos a vela possuíam no passado – nem motor, nem baterias, eletricidade, muito menos qualquer coisa que lembrasse vagamente tecnologia.
Ele navegava apenas com um sextante, guiava-se pelas estrelas e não dava a mínima bola para conforto – embora fosse filho de um rico empresário.
Era um velejador purista e um aventureiro nato. E, também, um mulherengo incorrigível.
Ao longo de sua vida, quase toda passada no mar (entre outras façanhas, deu duas voltas ao mundo navegando com barcos que não tinham nada além do básico), Peter teve incontáveis companheiras e casou-se nada menos que sete vezes – e, de certa forma, também levou quase todas as suas esposas para o mar, o que, inclusive, explicava o por que de tantos casamentos.
Com duas delas, Peter teve filhos, nascidos e criados a bordo do barco no qual moravam.
Mas, tragicamente, perdeu ambas em acidentes no mar, tornando-se assim, também, duplamente viúvo e responsável por criar, sozinho, os dois filhos: Thomas, nascido em 1976, e Carmen, oito anos e um novo casamento depois.
A paixão de Peter por barcos extremamente básicos só não era maior do que pelas mulheres.
Na primeira vez em que buscou companhia para navegar, após se separar de sua primeira esposa (a única que ele não conseguiu convencer a viver no mar, e que, por isso mesmo, logo virou “ex”), o norueguês deixou claro que teria que ser uma mulher, sem esconder suas segundas intenções.
“Se eu estivesse satisfeito em dormir sozinho no barco, teria procurado um homem como tripulante”, explicava às eventuais candidatas, com uma desconcertante franqueza machista.
E uma delas aceitou.
Mas não por muito tempo.
Não demorou muito e Lillemor, segunda esposa do velejador, abandonou o barco no início de uma viagem de volta ao mundo, quando ainda estavam no Caribe, após antever a precariedade da vida que levariam dali em diante.
Peter não se importou com a decisão da esposa e, ali mesmo, na Ilha de Santa Lucia, conheceu Bjula, uma magnetisante filha de uma feiticeira local, que impôs apenas uma condição para seguir viagem com ele: que Peter jamais removesse uma pequena argola que ela mesma, com uma agulha enferrujada, enfiou em sua orelha, feito brincos de um pirata – e que ele manteve até o fim da vida.
Já a união dos dois durou quase nada.
E nem chegaram a partir juntos, para realizar o sonho de Peter de dar a volta ao mundo.
Mas, Peter logo conheceu outra mulher: a francesa Simonne, uma professora que dava aulas na Martinica.
Apaixonada pelo norueguês, ela se licenciou do trabalho e seguiu com ele para o Taití, onde chegaram meses depois.
Simonne, no entanto, precisou retornar à Martinica, para mais um período na escola, deixando Peter sozinho na tentadoramente romântica Polinésia Francesa.
Foi o bastante para ele engatar um longo romance com uma nativa, e Simonne logo ficou sabendo.
Era o fim de mais um casamento.
Mas Peter não ficou solteiro por muito tempo.
Em seguida, outra francesa, Lydia, entrou na sua vida errante no mar.
Só que, desta vez, com consequências trágicas.
Três anos após dar a luz, em pleno oceano, ao primeiro filho de Peter, um menino chamado Thomas, Lydia foi assassinada, também no mar, por piratas filipinos, que tentaram assaltar o barco da família.
Peter só sobreviveu porque os bandidos, aparentemente, se sensibilizaram com a presença da criança a bordo e decidiram poupá-lo.
Mesmo assim, o norueguês foi recebido com certa desconfiança pela Polícia, ao retornar para terra firme sem a esposa a bordo.
Suspeitas (ou fantasmas da má sorte) voltariam a rondar Peter Tangvald no seu casamento seguinte, com a taiwanesa Ann, com quem ele teve seu segundo filho: a menina Carmen.
Durante uma travessia do Atlântico, Ann foi atingida pela retranca da vela do barco, caiu no mar e jamais foi encontrada.
A morte de mais uma esposa em circunstâncias difíceis de comprovar – e sob o eterno silêncio do mar – renderam a Peter um apelido nada lisonjeiro: Barba Negra dos Mares, embora ele fosse loiro feito um viking e nem de longe um assassino.
Ao contrário, o norueguês era pacífico feito um monge budista e um pai tão dedicado que decidiu criar, sozinho, no barco, os dois filhos – cada um de um casamento diferente, mas órfãos das respectivas mães, ambas mortas no mar.
Durante um par de anos, entre um namorico e outro, Peter fez longas navegações com suas duas crianças, chamando a atenção por onde passava tanto pela simplicidade dos seus barcos quanto pela curiosa tripulação infantil.
Isso atraiu a atenção também de Florence, uma canadense com quem Peter – adivinhe só! – se casou novamente, e com quem teve seu terceiro filho: outra menina, chamada Virgínia.
Mas ela pouco conviveu com os meios-irmãos no barco-casa da família, porque Florence, temendo ter o mesmo destino das duas esposas de Peter que a antecederam, não demorou e mudou de ideia sobre viver em um veleiro.
Ela, então, decidiu desembarcar – do barco e do casamento –, e foi viver no Canadá, com a filha.
Já Peter seguiu navegando com os outros dois filhos.
E foi quando o pior aconteceu.
Em 22 de julho de 1991, ao se aproximar da Ilha de Bonaire, no Caribe, o barco do norueguês, então um veleiro de dois mastros batizado L’Artemis de Pytheas, que ele mesmo construíra sob os mesmos princípios da extrema rusticidade, atropelou um recife de coral, possivelmente pela falta de um motor que permitisse mudar de direção a tempo, e afundou na hora, matando tanto o velejador, então com 66 anos de idade, quanto sua filha Carmen, de apenas sete.
O outro filho de Peter, Thomas, então com 15 anos de idade, nada sofreu, porque não estava a bordo no momento da colisão, e sim seguindo o pai, com um barquinho.
Thomas escapou com vida do avidente.
Mas viu o pai e a irmã também morrerem no mar, bem diante dele, tal qual já havia acontecido com sua mãe e uma de suas madrastas.
Era mais uma tragédia na família.
E isso, mais tarde, se repetiria com ele próprio.
Thomas Tangvald conseguiu a proeza de levar uma vida ainda menos convencional que a do pai.
A começar pelo fato de que nasceu no mar – literalmente.
Quando ele veio à luz, Peter e sua mãe, Lydia, navegavam no Estreito de Malaca, na costa da Malásia, e não deu tempo de buscar um local para o parto.
O nascimento aconteceu no próprio barco, com Peter se desdobrando entre a pilotagem do veleiro e o auxílio a parturiente.
Mas deu certo.
Problemas mesmo só surgiram semanas depois, quando o casal, agora acrescido de um novo tripulante, finalmente parou em um porto, no Sultanato de Brunei.
Temendo problemas legais, já que a criança ainda não tinha documento algum, Peter e Lydia esconderam o bebê, enquanto recebiam a bordo os agentes da imigração, a quem haviam declarado serem os únicos ocupantes do barco – até que Thomas começou a chorar na cabine.
A travessura rendeu uma ameaça de prisão ao casal, por mentir aos oficiais.
Mas acabou sendo relevada, graças ao próprio bebê, que não poderia ser levado para a prisão, muito menos ser mandado embora, sozinho no barco.
Rapidamente, Thomas mostrou ser um marinheiro nato – e ainda mais purista do que seu pai na arte de navegar.
Só dormia na cabine de proa, onde todos os barcos balançam bem mais, e, ainda criança, aprendeu os princípios da navegação estelar, guiando-se no mar apenas pelos astros e estrelas no céu.
Só de vez em quando ia para alguma escola, nas escalas temporárias que o pai fazia, aqui e ali.
Frequentou nada menos que 15 delas, nos seus primeiros anos de vida.
Mesmo assim, quando Peter morreu e Thomas foi viver temporariamente com um casal de amigos de seus pais, na Inglaterra, formou-se com facilidade tanto em matemática quanto na complexa área dos fluídos dinâmicos, tema que particularmente lhe interessava, por causa dos barcos.
E tão logo se formou, construiu ele próprio um pequeno veleiro – sem motor, obviamente – e com ele atravessou, sozinho e sem nenhum equipamento de navegação, o Atlântico.
Tinha, então, apenas 22 anos de idade.
Em Porto Rico, onde fincou âncora por algum tempo, Thomas (que, tal qual o pai, era um apaixonado por primitivas embarcações regionais) comprou um velho casco de madeira e decidiu transformá-lo na sua nova casa.
Construiu uma acanhada cabine, batizou o barco de “Oasis”, e foi viver nele, com sua jovem esposa, que conhecera lá mesmo, e um filho recém-nascido.
Mais tarde, ao se interessar pelas embarcações usadas pelos pescadores no Nordeste brasileiro, decidiu que se mudaria para o Brasil.
Em março de 2014, Thomas embarcou no Oasis com a mulher, já novamente grávida, e o filho pequeno, e navegou até a Guiana Francesa, de onde partiu, desta vez sozinho, rumo à ilha de Fernando de Noronha, onde pretendia se estabelecer com a família.
O objetivo da viagem era conhecer a ilha e voltar para buscar a mulher e o filho.
Mas Thomas não chegou à Fernando de Noronha.
Em algum ponto entre a Guiana Francesa e a costa brasileira, ele desapareceu, juntamente com o seu barco.
Tal qual seu pai e sua mãe, Thomas também morreu no mar, mas em circunstâncias ainda mais dramáticas, porque nenhum vestígio, nem dele nem do barco, foi encontrado.
No blog que ele mantinha na Internet, seu último post foi sobre a engenhosidade dos saveiros da Bahia, que ele sonhava conhecer de perto.
Não deu tempo.
A peculiar vida de Thomas Tangvald no mar terminou como a do seu pai: com mais uma tragédia, a bordo de um barco pra lá de rústico.
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