No início da década de 1980, o milionário americano Gregg Bemis fez o negócio mais barato e, também, mais bizarro da sua vida.
Por um mísero um dólar, comprou um navio naufragado.
Mas não um navio qualquer, e sim o Lusitânia, um dos mais famosos transatlânticos do mundo no início do século passado, que afundou ao ser atacado pelo submarino alemão U-20, na costa da Irlanda, no começo da Primeira Guerra Mundial.
Só que, depois, Bemis precisou gastar milhões de dólares para ter os direitos legais sobre o naufrágio reconhecidos também pelo governo irlandês.
Mas isso jamais o incomodou.
Até porque dinheiro não era exatamente um problema para ele.
O que Gregg Bemis queria de fato era preservar os restos do naufrágio, considerado o segundo mais relevante do mundo, depois apenas do Titanic, e, com isso, tentar desvendar um mistério histórico: o que teria provocado a segunda explosão no Lusitania, logo após o impacto do torpedo, que, esta sim, pôs o transatlântico a pique, em apenas 18 minutos? – rápido demais para um navio tão grande, o que resultou na morte de 1 195 das 1 959 pessoas que havia a bordo.
Historicamente, a hipótese mais plausível – e defendida também pelo milionário – era que a segunda explosão fora causada pelo carregamento de munições que os Estados Unidos, então ainda neutros no conflito, haviam doado à Inglaterra para ajudar nos combates contra a Alemanha, que o Lusitania secretamente transportava – embora sempre tenham pairado dúvidas se não teria havido apenas a explosão das caldeiras do navio.
Para comprovar uma coisa ou outra, era preciso examinar o naufrágio, que repousa a mais de 90 metros de profundidade, a cerca de 10 milhas da costa da Irlanda, e também evitar que saqueadores dilapidassem os restos do histórico transatlântico.
Por esses dois motivos, Bemis, que chegou a mergulhar para ver o navio com seus próprios olhos, em 2004, quando já somava 76 anos de idade (um feito notável, dada a grande profundidade), decidiu comprar o navio afundado – algo, até então, inédito e só feito por empresas interessadas em sucatear barcos naufragados.
Bemis, no entanto, só queria preservar o que restara do Lusitania e alimentar ainda mais a sua nebulosa história.
O Lusitania, então o maior transatlântico da empresa inglesa Cunard, partira de Nova York com destino a Liverpool no primeiro dia de maio de 1915.
Naquela época, a Inglaterra estava em apuros com os alemães e precisava convencer os Estados Unidos a ajudá-la, no que viria a se tornar a Primeira Guerra Mundial.
Surgiu, então, uma oportunidade: o Lusitânia, um navio inglês de alto luxo, estava partindo abarrotado de passageiros ingleses e americanos.
Cheios também estavam os seus porões – só que com uma carga altamente explosiva: munições que a Inglaterra contrabandeava dos Estados Unidos.
O navio era uma espécie de bomba flutuante, camuflado de transatlântico.
Um mês antes, os jornais americanos haviam publicado um aviso da embaixada da Alemanha de que, a partir daquela data, todos os navios ingleses e de seus aliados estariam sujeitos a serem atacados.
Mesmo assim, dias depois, o Lusitânia, então o maior transatlântico da empresa inglesa Cunard, partiu de Nova York com destino a Liverpool, levando quase 2 000 pessoas e aquela perigosa carga.
A travessia do Atlântico Norte transcorreu sem nenhum contratempo.
Mas, na manhã de 7 de maio, ao chegar à zona mais crítica da viagem, junto à costa da Irlanda, onde sabidamente abundavam os submarinos alemães, o comandante do Lusitânia recebeu estranhas ordens do Almirantado Britânico, então chefiado por Winston Churchill.
Elas mandavam o navio se aproximar bastante da costa, o que limitava sua capacidade de manobra, e interromper a navegação em ziguezagues, como recomendavam as precauções em tempos de guerra.
Além disso, o cruzador Juno, que seria enviado para proteger o transatlântico, não apareceu no local determinado.
O resultado foi uma terrível tragédia, para muitos covardemente premeditada pelos próprios ingleses.
Para se proteger de um bem provável ataque alemão, o comandante do Lusitânia passou a contar apenas com o espesso nevoeiro daquela manhã na costa irlandesa, que, no entanto, também o impedia de navegar mais rápido.
Assim, navegando a baixa velocidade, em linha reta e sem as habituais manobras de defesa, que confundiam os radares inimigos, o Lusitânia virou alvo fácil para o submarino alemão U 20, que navegava submerso, em busca de uma alguma presa.
E o que ele encontrou foi um verdadeiro prêmio: um grande transatlântico, navegando sem nenhuma proteção.
O primeiro torpedo atingiu o meio do casco do Lusitânia com precisão germânica, e o seu rastro de morte na água, vindo na direção do navio, foi testemunhado por alguns passageiros que estavam no convés naquela manhã. Imediatamente após o impacto, aconteceu uma segunda explosão, ainda mais forte: a da carga que o próprio navio transportava.
Já a segunda explosão pôs o grande transatlântico a pique em pouquíssimo tempo.
Em apenas 18 minutos ele afundou por completo.
Tão rápido que não deu tempo nem de baixar todos os botes salva-vidas para os que sobreviveram as explosões.
Muitos outros passageiros morreram afogados.
Para completar o cenário da tragédia, os primeiros barcos de regaste só chegaram ao local duas horas depois, apesar da proximidade com a costa.
E nem assim o cruzador Juno, que deveria ter escoltado o Lusitânia, apareceu para ajudar.
Uma das explicações para isso é que o governo inglês tenha tido receio de perder um valioso navio de guerra para o submarino alemão, que, depois de afundar o transatlântico, deve ter ficado de tocaia na região.
A macabra contabilidade do episódio foi de 1 195 mortes, entre as 1 959 pessoas que havia a bordo do Lusitânia — quase o mesmo que o Titanic, três anos antes.
Nos Estados Unidos, a indignação com a morte de tantos cidadãos americanos levou, por fim, o país a aderir a Guerra, como aliado da Inglaterra, apesar de todos os indícios de que teria sido o próprio Churchill que teria tramado (ou, pelo menos, facilitado) o ataque ao transatlântico.
Se este era o plano, deu certo.
Era justamente isso o que Bemis quis investigar, ao comprar os direitos sobre o naufrágio e investir um bom dinheiro para explorá-lo.
Mas não houve tempo para isso.
Em 21 de maio de 2020, aos 91 anos, Bemis morreu de câncer, sem conseguir desvendar o mistério que o motivava há quase quatro décadas: o que levou o Lusitania a afundar tão rapidamente?
A questão, no entanto, permaneceu viva, porque, um ano antes, o milionário havia doado os direitos sobre o naufrágio a um museu dedicado ao navio, montado em uma antiga torre no promontório de Old Head, em Kinsale, na costa da Irlanda, ponto de terra firme mais próximo do local onde o Lusitania afundou, naquela trágica manhã de 7 de maio de 1915.
Na ocasião, o milionário explicou que estava doando o seu bem mais precioso, na esperança de que, um dia, a verdadeira história do naufrágio do Lusitania pudesse vir à tona, o que, no entanto, não aconteceu até hoje.
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