A regata Fastnet é, talvez, a principal competição de veleiros da Inglaterra, país que ama os barcos a vela quase tanto quanto o futebol. É, também, uma das regatas mais antigas e famosas do mundo, disputada desde 1925 num percurso de 605 milhas náuticas, entre a Inglaterra e a costa da Irlanda.  Ela acontece a cada dois anos, sempre com número recorde de participantes. Já teve até vitória de um barco brasileiro, o heróico veleiro Saga, do comandante Erling Lorentzen, que foi fita azul em 1973.

Mas, apesar de toda a fama, na edição de 1979, a Fastnet (nome de um farol encarapitado numa rocha na ponta sul da costa da Irlanda, que marca o ponto de retorno do percurso) protagonizou uma das piores tragédias da história da vela.

Uma feroz tempestade, com ventos que superaram os 50 nós, se abateu sobre os 306 barcos participantes e deixou um rastro de 23 naufrágios, 75 abandonos de embarcações e nada menos que 15 mortos.

Gerou, também, a maior operação de resgate já conduzida pelo Reino Unido no mar, em tempos de paz, envolvendo mais de 4 000 homens. E tudo porque ninguém imaginava que aquela sabida tempestade que se aproximava seria tão forte.

Quando os barcos partiram da ilha Cowes, na Inglaterra, no dia 11 de agosto, a previsão para os dias seguintes era de ventos entre 22 e 27 nós, a despeito do mau tempo que se avizinhava.

Mas, dois dias depois, na noite do dia 13 de agosto (não poderia haver data mais agourenta), quando os ponteiros da regata se aproximavam do farol que a batiza, aconteceu àquilo que os meteorologistas costumam chamar de “freak storm”, ou “tempestade louca”, uma tormenta que trai todas as previsões e desaba feito um furacão no oceano.

Ventos de 40 nós passaram a castigar a flotilha e, em questão de horas, atingiram o nível de Força 11, na escala Beaufort. A superfície do mar, então, se transformou em montanhas descontroladas de água, e as rajadas, fortíssimas, passaram a rasgar as velas dos barcos feito folhas de papel.

Para completar o cenário desesperador, naquela época nem todos os barcos eram obrigados a ter rádios a bordo, o que impediu alertas de última hora da meteorologia e privou muitos competidores de pedir socorro. Com isso, o que era para ser apenas uma divertida regata, virou uma terrível luta pela sobrevivência — que muitos não venceram.

As baixas começaram rapidamente. Uma das primeiras vítimas foi o veleiro Metric, que foi varrido por uma onda que elevou tanto o casco que deixou a quilha fora d´água, arrancando os dois ocupantes do barco – que só sobreviveram porque usavam cintos de segurança.

Em seguida, o Camargue, depois de capotar, perdeu o leme e foi abandonado por sua tripulação, que passou para a balsa salva-vidas. E muitos outros decidiram fazer o mesmo, depois que seus veleiros passaram a capotar feito barquinhos de brinquedo.

No total, nada menos que 75 barcos capotaram naquela tempestade. Alguns, diversas vezes, como o Grimalkin, que virou cinco vezes, matando, na última delas, dois de seus tripulantes e deixando um terceiro, Nick Ward, abandonado à própria sorte num barco avariado e totalmente à deriva. Ward acabaria sendo salvo por um helicóptero, quando já era dado como morto também.

No entanto, como as condições meteorológicas eram terríveis, só na manhã seguinte, quando os ventos baixaram para a escala 9, com rajadas de cerca de 45 nós, é que puderam começar os resgates. E o cenário que os helicópteros encontraram foi dramático. Havia veleiros destroçados e velejadores boiando na água por todos os lados – alguns, já mortos.

No total, 23 barcos foram dados como perdidos, abandonados ou afundados naquela prova e 125 velejadores resgatados no mar – 15 deles já sem vida, por conta de uma noite inteira nas frias águas do Atlântico Norte.

Apenas 85 barcos, dos mais de 300 que largaram, completaram a prova. Na frente, chegou o veleiro Tenacious, do então poderoso dono da rede de TV CNN, Ted Turner, que só escapou do pior porque estava bem à frente dos demais competidores quando o mundo desabou – e ele sequer comemorou.

O favorito, o barco Kialoa, também completou o percurso. Mas seu comandante chegou com várias costelas quebradas.

A tragédia causou comoção nacional na Inglaterra e gerou uma série de mudanças nas regras das regatas oceânicas, que se mantém até hoje. Entre elas, a obrigatoriedade de todos os barcos terem, no mínimo, um rádio a bordo, o que atualmente parece óbvio – mas, naquela época, não era.

Mesmo assim, seis anos depois, em 1985, outro incidente marcou esta famosa regata: o maxi-veleiro Drum capotou e deixou o então astro da música pop Simon Le Bom, que fazia parte da tripulação, preso debaixo do casco por algumas horas, até ser resgatado.

Mas nada que se compare ao que aconteceu na Fastnet naquela trágica noite de 13 de agosto de 1979, 40 anos atrás.

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