Em outubro de 2021, o americano Aaron Carotta, um ex-repórter de TV de 43 anos, partiu da costa oeste dos Estados Unidos em busca de um feito inédito: tornar-se o primeiro homem a dar a volta ao mundo com um barco a remo.
Mas a aventura terminou antes mesmo de ele atingir a metade do primeiro oceano a ser atravessado, um ano e meio depois.
Em 20 de maio de 2023, quando remava, sozinho, no Oceano Pacífico, o sinal de satélite emitido pelo barco de Aaron, uma espécie de caiaque oceânico hi-tech, com 6,50 metros de comprimento, batizado de Smiles (“Sorrisos”, em português), parou de funcionar.
Era um mal sinal.
Embora a perda do sinal tivesse sido consequência apenas de um colapso nas placas solares que geravam energia para o barco, aquilo deixou o americano incomunicável com sua rede de amigos em terra-firme – e isso, mais tarde, dramatizaria toda a história.
A falta de notícias deixou os amigos de Aaron apreensivos, embora o remador estivesse bem e seguisse avançando, rumo à Polinésia Francesa, sem que, no entanto, eles soubessem disso.
Seu único problema era não conseguir mais se comunicar com o mundo exterior.
Mas isso não era motivo para pedir socorro através do único aparelho que ainda tinha um pouco de bateria, uma espécie de localizador pessoal via satélite.
Aaron não via motivos para desencadear um complexa e cara operação de buscas, sendo que estava bem e com um bom estoque de água e comida.
Mas os amigos do remador não tinham como saber isso e decidiram acionar a Guarda Costeira dos Estados Unidos – que, por sua vez, retransmitiu o alerta de buscas no mar para equipes de resgate no Havaí e no Taiti.
Durante dias, barcos e aviões procuraram pelo americano, na vastidão do oceano. Mas nada encontraram, já que a última comunicação feita por ele, informando sua localização, acontecera muito tempo antes.
Com o passar do tempo, as buscas foram suspensas, mas ficou o alerta para quem estivesse navegando pela região, sobre a busca pelo aventureiro.
Também nada aconteceu.
Quase um mês depois, o silêncio do remador deu lugar a um aflitivo pedido de socorro – feito por ele mesmo.
Mas por outro motivo.
Nas primeiras horas da manhã do dia 15 de junho, o barco do remador foi colhido por uma grande onda e virou de cabeça para baixo, sem que ele tenha conseguido fazê-lo voltar à posição original.
Aaron passou um bom tempo na água, tentando desvirar o barco, até que, exausto, decidiu abandonar o casco emborcado e passar para uma balsa salva-vidas inflável, que levava no caiaque.
E usando o pouco de bateria que lhe restava, ligou o seu localizador pessoal, uma espécie de transmissor via satélite, que dispara sinais de emergência, e pediu ajuda.
Agora, para valer.
Como as buscas pelo remador já haviam sido encerradas, e como ele estava bem distante da área onde presumivelmente havia sido dado como “desaparecido” (além de estar a mais de 1 000 quilômetros da terra firme mais próxima), as chances de o sinal de emergência emitido por Aaron ser detectado eram mínimas.
Foi quando outro fato, que nada tinha a ver com o seu resgate, acabou se tornando a sua salvação.
Uma semana antes do infortúnio que acometeu o aventureiro, o barco de outro navegador americano, David Wysopal, que partira do México e atravessava o Pacífico a bordo de um veleiro de pouco mais de 13 metros de comprimento, na companhia do filho, Zachary, de apenas 12 anos de idade, deixou igualmente de transmitir sua localização, mais ou menos na mesma região do problema que acometera o remador.
O desaparecimento do barco de David dos aparelhos de rastreamento, que também eram monitorados por amigos dele em terra firme, agravado pelo fato de haver uma criança a bordo, desencadeou uma grande operação de buscas, que, no entanto, a exemplo do caso do remador americano, também não surtiu efeito.
Durante dias, aviões e barcos de uma base de resgates na Polinésia Francesa vasculharam o mar, em busca de pai e filho supostamente desaparecidos, mas nada encontraram.
Por um bom motivo: não havia nada de errado com o barco do americano – ele apenas atravessava uma zona onde o seu rastreador não funcionava.
Mas nem ele nem seus amigos sabiam disso.
O que também fomentou o mal entendido, foi que, ao zarpar com o filho, David não deixou claro para onde estavam seguindo.
Ele apenas comentou com um amigo que, talvez, fosse até as Ilhas Samoa, no Pacífico Sul, em busca de emprego em algum estaleiro.
Mas, quando sua localização parou de ser exibida nas telas do rastreadores, o barco do americano seguia na direção das ilhas da Polinésia Francesa, embora isso fosse apenas a rota escolhida por David no Pacífico.
Para aumentar ainda mais a confusão, na véspera da partida da costa mexicana, o filho de David ligou para a mãe, a nicaraguense Belkis González, que era separada do marido, dizendo apenas que eles “ficariam uns três ou quatro meses no mar”, sem maiores detalhes.
Como não havia autorizado nenhuma viagem do filho, a mãe de Zachary procurou a Polícia e denunciou o ex-marido por sequestro do menino – situação que se tornou ainda mais dramática quando ela ficou sabendo do “sumiço” do barco.
Ainda que por outro motivo, a mãe de Zachary foi a primeira a intuir que eles poderiam apenas estar apenas sem comunicação, mas atribuiu isso a uma atitude proposital do ex-marido, que poderia ter desligado os equipamentos de rastreamento do barco e fugido com o menino para alguma ilha, a fim de escapar da Polícia.
“Passei a torcer para que o meu filho tivesse sido realmente sequestrado, porque isso significava que ele estava vivo”, disse Belkis, na ocasião.
De certa forma, a falta de notícias do filho a confortava.
Ela conjecturava que “era melhor não ter notícia alguma, do que receber uma ruim”.
Enquanto isso, alheios a tudo, David e Zachary seguiam em frente no oceano, rumo às ilhas Samoa, sem saber que eram procurados intensamente por equipes de resgate.
Muito menos o que o destino deles e do remador Aaron Carotta se cruzariam no exato instante em que o rastreador do veleiro do americano parou de funcionar.
Naquele dia, enquanto David enviava aquela que seria sua última posição para os amigos em terra firme, Aaron também perdia a única fonte de energia que seu pequeno barco tinha: os painéis solares que alimentavam as baterias do caiaque do remador pararam de funcionar.
Sem energia no barco, ele não tinha mais como enviar mensagens ao que acompanhavam à distância a sua jornada no mar.
E aquele perturbador silêncio, levou os amigos do remador a também acionarem a Guarda Costeira.
Mas não ao mesmo tempo em que os amigos de David.
Também alheio ao desnecessário pedido de ajuda feito pelos amigos, Aaron Carotta seguiu remando, ainda que incomodado por não ter mais uma fonte de energia para recarregar as baterias dos seus equipamentos.
Mas ele estava bem, possuía um bom estoque de água e comida, e não via o menor sentido em acionar o único equipamento que tinha ainda com um pouco de bateria – o seu localizador pessoal portátil – para pedir socorro, já que não estava em uma situação de risco.
Aaron se recusava a desencadear uma onerosa operação de resgate no meio do Pacífico só porque ficara sem energia.
Mas, um mês depois, o que não passava de um falso alarme, se tornaria uma emergência de fato.
Nas primeiras horas da manhã do dia 15 de junho, quando aquela onda virou o barco do remador e o obrigou a passar para uma precária balsa salva vidas inflável, Aaron não pensou duas vezes.
E acionou o sinalizador, que disparava sinais de emergência, com o pouco de bateria que restava no aparelho.
Como as buscas pelo remador já haviam sido encerradas há muito tempo – e ele, mesmo não sabendo disso, sabia que estava muito longe de qualquer ilha -, as chances de o sinal do aparelho ser captado por alguém eram mínimas.
Coisa de uma em um milhão.
Foi quando o destino do remador e do velejador David se cruzaram novamente.
No exato instante em que o remador ativou o seu localizador, estava em curso a última operação de buscas pelo veleiro de David – e o bip do aparelho tocou em um dos aviões que faziam a varredura no mar, em busca do veleiro. A aeronave estava distante, mas seguiu imediatamente para o local, imaginando encontrar pai e filho no mar.
Quem, porém, estava lá era Aaron, já com água pelos tornozelos na balsa cada vez mais murcha, e um ameaçador tubarão nadando ao redor dela.
Apenas um par de horas havia se passado desde que ele acionara o alarme, que durou apenas alguns minutos e logo parou de funcionar, por falta de bateria.
E a imagem daquele avião de resgate se aproximando foi a melhor coisa que Aaron viu na vida, mesmo sem saber como aquilo tinha sido possível.
A operação, que buscava um navegador, acabou salvando outro.
E teria sido totalmente desnecessária, uma vez que nada havia ocorrido com o barco do pai e filho, não fosse o fato de que, graças a ela, aquele remador, cuja existência as equipes desconheciam, fora resgatado.
Um enorme golpe de sorte.
Para todos.
No entanto, quando o resgate chegou ao local, Aaron não pode ser resgatado de imediato.
A equipe estava em um avião, não em um helicóptero, aeronave que não permite o desembarque de resgatistas no mar, muito menos o embarque de vítimas.
E aquele ponto era distante demais de qualquer terra firme para a autonomia limitada dos helicópteros de socorro.
A solução foi lançar víveres no mar, próximos a balsa, e pedir para Aaron aguardar o resgate, que teria que ser feito pelo mar.
Mas o remador sequer pode alcançar os objetos, porque o tal tubarão continuava rondando ameaçadoramente a balsa, cada vez mais murcha, por sinal.
Do avião, o piloto avisou o centro de operações de buscas sobre o inesperado achado (procuravam por duas pessoas, mas acharam uma terceira, que nada tinha a ver com o caso), e alguns navios que navegavam na região foram orientados a recolher o náufrago.
Mesmo assim, a embarcação que estava mais próxima, o cargueiro Baker Spirit, levou cerca de 30 horas para chegar ao local.
Aaron, por fim, foi resgatado e seguiu viagem, no próprio navio, até o Havaí, onde desembarcou dias depois, são e salvo – bem como David e seu filho, que só ficaram sabendo das complexas operações de buscas por eles no mar, e do salvamento do remador que o “sumiço” deles involuntariamente gerou, quando chegaram à Samoa.
Por fim, salvaram-se todos os “desaparecidos”.
Que, afinal, jamais estiveram perdidos.
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