Apenas quatro dias após a Alemanha invadir a Polônia, em setembro de 1939, dando início a Segunda Guerra Mundial, um cargueiro com a bandeira nazista, como era hábito nos navios alemães da época, entrou no porto do Rio de Janeiro.

Seu objetivo, contudo, nada tinha de bélico.

O Wakama atracara para receber um carregamento regular de café, arroz, minério de ferro e banha, entre outras mercadorias – nem todas necessariamente especificadas nos manifestos de carga, como também acontecia com frequência no passado.

Havia, no entanto, um segundo intuito na chegada do Wakama ao Rio de Janeiro: obedecer ordens recém-recebidas de que todos os navios alemães deveriam se abrigar em portos de países neutros no conflito que acabara de eclodir, como era o caso do Brasil.

Na segurança do porto carioca, o Wakama chegou e ficou.

Por seis longos meses.

Até que, em 11 de fevereiro do ano seguinte, logo após o Carnaval (que, por sinal, os admirados 46 tripulantes alemães do Wakama aproveitaram bastante na Cidade Maravilhosa), veio outra ordem da Alemanha: o navio deveria completar rapidamente o seu carregamento e partir, sem nenhum alarde.

Naquela mesma noite, o comandante alemão Berhard Schacht mandou apagar todas as luzes do navio e deixou a cidade, horas depois de outro navio alemão, o La Corunã, também ter partido do porto do Rio de Janeiro, com o mesmo destino: a Alemanha, então às voltas com a guerra.

Mas o Wakama não foi além de 100 milhas do porto de onde partiu, na calada da noite.

Horas depois, quando navegava nas imediações de Cabo Frio, no litoral norte do Rio de Janeiro, o Wakama emitiu um pedido de socorro, sem, contudo, maiores detalhes.

Em seguida, afundou, levando com ele dois mistérios: ataque inimigo ou auto-destruição do navio? – o que teria feito o Wakama naufragar?

E o que mais ele secretamente transportava, a ponto de, em 1980, 41 anos depois, um navio alemão de resgate ter chegado ao Rio de Janeiro com a missão de vasculhar os restos naufragados do velho cargueiro em águas brasileiras?

Jamais houve respostas para nenhuma das duas dúvidas.

Construído quase duas décadas antes como um simples cargueiro, o Wakama estava longe de ser um prodígio da engenharia alemã.

E com uma tripulação formada por pacatos marinheiros mercantes, nada tinha de navio de combate.

Então, por que acabou protagonizando aquele que se tornaria o primeiro ato belicoso de guerra no litoral brasileiro, e, sabidamente, levou até navios ingleses a invadirem as águas territoriais brasileiras para caçá-lo, logo após a partida do Rio de Janeiro?

As dúvidas começaram na própria saída do Wakama do porto carioca, que só aconteceu depois que ficou claro que o La Corunã conseguira furar o bloqueio que alguns navios ingleses faziam naquele trecho da costa brasileira.

Segundo uma das teorias da época, os ingleses deixaram o La Corunã passar incólume de propósito, a fim de induzir o Wakama a deixar o porto e poder ser atacado.

Mas, por que só ele?

O que o Wakama estaria transportando que interessasse tanto aos ingleses, a ponto de fazer a própria tripulação do navio alemão dar cabo dele, com uma carga de explosivos? – esta a hipótese mais provável do que aconteceu naquela noite, tese corroborada por testemunhas e endossada pelos jornais da época.

De acordo com ela, o comandante Schacht havia preferindo afundar o próprio navio do que entregá-los aos ingleses que se aproximavam.

Mas – de novo -, por quê?

A resposta poderia estar em parte da carga que o Wakama, supostamente, transportava em sigilo: um enorme cristal de rocha de quase 150 quilos, extraído no Brasil, que estaria sendo levado para a Alemanha para ser usado na indústria ótica e eletrônica da época, ambas com capacidade de ajudar os nazistas nos combates.

Entre entregar a valiosa carga ao inimigo ou fazê-la afundar junto com o navio, o comandante Schacht teria preferido a segunda opção.

Até porque isso garantiria a sobrevivência da tripulação, já que pouparia o indefeso cargueiro de ser bombardeado pelos navios ingleses.

Ao que tudo indica, quando Schacht percebeu que o Wakama fora localizado por uma aeronave de patrulha inglesa, deu ordem para baixar os barcos salva-vidas, acionou bombas de retardo para explodir o casco e abandonou o navio com todos os seus homens – que, em seguida, foram capturados no mar pelo cruzador inglês Dorsetshire, que estava nas imediações, ao que tudo indica, à espera do próprio Wakama.

Do navio alemão restaram apenas as baleeiras vazias no mar, o que, num primeiro momento, levou as estupefatas autoridades brasileiras a imaginar que seus ocupantes pudessem ter sido mortos.

Mas, como nos dias subsequentes não apareceu nenhum corpo nas praias da região, ficou claro que eles haviam sido resgatados.

Dias depois, o Dorsetshire atracou na Cidade do Cabo, do outro lado do Atlântico, e ali desembarcou, como prisioneiros de guerra, os 46 tripulantes do Wakama – entre eles, um “quase” brasileiro.

O carpinteiro e atirador nas horas vagas Joseph Haas nasceu na Alemanha, mas vivia no interior de Santa de Catarina, com mulher e filhos brasileiros, há mais de 30 anos.

Mas, com a iminência da guerra, o sentimento de que deveria se unir aos conterrâneos falou mais alto, e Haas decidiu voltar à Alemanha.

Ele, então, abandonou a família, pegou um navio em Itajaí e desembarcou no Rio de Janeiro, coincidentemente logo após a chegada do Wakama à cidade.

Lá, procurou o capitao Schacht e propôs pagar pela viagem.

Mas seus dotes de carpinteiro – e, muito provavelmente, também sua habilidade com armas, por conta do hobby que cultivava – acabaram rendendo um convite para viajar de graça, como tripulante.

E foi assim que aquele improvável tripulante de última hora embarcou na última viagem do Wakama.

Só quando a terminou a guerra e toda a tripulação que ficara confinada em campo de prisioneiros na África do Sul foi liberada para voltar para casa, é que o alemão-brasileiro Haas finalmente chegou à Alemanha – mas apenas para constatar que sua cidade natal havia virado escombros, e que todos os seus parentes estavam mortos.

Desiludido e sem ter como se manter na severa crise econômica que assolou a Alemanha no pós-guerra, ele resolveu voltar ao Brasil, onde foi recebido com indignação pela família, que o abandonou em seguida.

Haas morreu 18 anos depois, em 1964, durante um exercício de tiro no clube que caça que ele frequentava, na cidade catarinense de Presidente Getúlio – ironicamente batizada em homenagem a Getúlio Vargas, o presidente brasileiro que ele tanto odiava, justamente porque colocara o Brasil em guerra contra a Alemanha.

Mais ou menos na mesma época, um grupo de pescadores cariocas recolhia as redes que haviam depositado no mar da cidade de Rio das Ostras, no litoral norte do estado, quando uma delas enganchou em algo no fundo.

Eram os restos do Wakama, que haviam sido finalmente descobertos, embora a história do “navio misterioso” fosse largamente conhecida na região.

Mas, por conta das explosões que o levaram o cargueiro alemão a pique (causada por navios ingleses ou pela sua própria tripulação – nunca o motivo do naufrágio foi descoberto), e após tantos anos debaixo d´água, o Wakama já não passava de uma pilha de ferros desconexos.

Ainda assim, 14 anos depois, em 1978, uma empresa brasileira de resgastes marítimos, criada especificamente com o intuito de explorar aquele naufrágio, contratou os serviços de um suspeito navio alemão, o Taurus, especializado nesse tipo de operação, para vasculhar os escombros do Wakama.

O que eles buscavam?

Aparentemente, o tal gigantesco cristal de rocha, além de outros eventuais itens valiosos que pudessem estar a bordo do navio sinistrado, na sua volta à Alemanha – como doações de guerra feitas por famílias e descendentes de alemães radicados no Brasil, como foi comum na época.

Oficialmente, porém, nada foi encontrado.

Dois meses depois de chegar sinistramente ao local do naufrágio e começar a remexer os escombros do velho cargueiro alemão, o Taurus retornou à Alemanha, no mais completo silêncio.

Se levou algo retirado do navio, nunca se soube.

O Wakama terminou os seus dias cercado pelos mesmos mistérios que o levaram ao fundo do mar do Rio de Janeiro, apenas quatro dias após o início da Segunda Guerra Mundial.

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