Ao ser lançado ao mar, em 1921, o Kobenhavn era o maior veleiro do mundo.

Media 354 pés de comprimento, deslocava 4 200 toneladas e tinha cinco gigantescos mastros.

Somadas, suas velas cobriam uma área equivalente à de três campos de futebol e pesavam oito toneladas.

Além disso, o superveleiro possuía casco de aço e, entre outros recursos que ainda eram novidades na época, um poderoso motor, movido a óleo diesel, para quando o vento não fosse forte o bastante para movimentá-lo.

Era um barco excepcional, feito para transportar grandes quantidades de carga em longas viagens, e, ao mesmo tempo, treinar jovens marinheiros para a então poderosa marinha mercante dinamarquesa, a quem o barco pertencia – como, aliás, seu nome, “Copenhague”, em português, nome da capital da Dinamarca, deixava evidente.

O Kobenhavn era motivo de orgulho de um país inteiro.

No dia do seu lançamento, foi visitado por cerca de 10 000 pessoas, entre elas, o próprio Rei e a Rainha da Dinamarca.

Em seguida, partiu para a sua travessia inaugural, que foi logo uma volta ao mundo, que durou mais de um ano.

Depois disso, o imponente barco passou a fazer viagens frequentes à América do Sul e Austrália, usando a velha rota pelas altas latitudes do planeta, apelidada pelos marinheiros de “40 Rugidores”, por causa do seu vento abundante, constante e poderoso, que passa o tempo todo “rugindo” sobre os barcos.

E foi em algum ponto desta região que tudo aconteceu.

Mas nunca se soube o quê?

Em certo momento entre o final de 1928 e o início de 1929 (nem a data pode ser fixada com precisão), o robusto, resistente e gigantesco Kobenhavn desapareceu completamente no mar, sem deixar vestígio algum – sequer detritos na superfície.

Nada, absolutamente nada do imenso veleiro jamais foi encontrado.

A começar pelos corpos dos seus 60 tripulantes, 54 deles jovens cadetes dinamarqueses, com média de 17 anos de idade.

Tudo o que se soube sobre o trágico destino do Kobenhavn é que ele partiu do porto de Buenos Aires, rumo à Austrália, em 14 de dezembro de 1928, sem nenhuma carga, porque seu comandante, o também jovem capitão Hans Ferdinand Andersen, de apenas 35 anos de idade, tinha ficado cansado de esperar que a burocracia argentina liberasse as mercadorias a serem embarcadas.

Para garantir a estabilidade do barco, ele, então, colocou 700 toneladas de areia nos porões, para servir de lastro para a longa viagem.

Além da carga não embarcada, outro contratempo – este positivo – marcou a partida do Kobenhavn de Buenos Aires.

Na véspera, um dos cadetes precisou retornar à Dinamarca, por motivos particulares.

Com isso, ele tornaria o único “sobrevivente” do veleiro, e, mais tarde, seus depoimentos sobre as virtudes do barco e a segurança que ele passava aos tripulantes ajudariam a tornar o desaparecimento do Kobenhavn ainda mais intrigante.

Como um barco tão moderno e evoluído poderia ter afundado e desaparecido por completo?

Uma semana após partir de Buenos Aires, quando navegava a cerca de 1 000 milhas da costa da Argentina – e quase a mesma distância da isolada ilha de Tristão da Cunha, no meio do Atlântico Sul -, o veleiro dinamarquês fez aquele que seria o seu último contato com o mundo exterior.

Ao se comunicar com o cargueiro norueguês William Blumer, que passava pela região, o capitão Andersen não reportou nenhum problema pelo rádio e seguiu em frente, rumo à Austrália – onde, no entanto, jamais chegou.

A travessia, embora longa e por uma rota famosa pelos ventos violentos, estava prevista para transcorrer sem maiores contratempos, porque era verão, época imune às grandes tempestades nas altas latitudes, que só costumam acontecer no inverno.

Se tudo desse certo, o Kobenhavn chegaria à Austrália após um período entre 42 e 55 dias de mar, e, de lá, retornaria à Europa, completando assim mais uma volta ao mundo.

Mas não foi o que aconteceu.

No começo, ninguém estranhou o atraso nem o silêncio.

Embora o Kobenhavn tivesse um ótimo equipamento de rádio de longo alcance, outra quase novidade na época, seu comandante costumava passar longos períodos sem se comunicar com terra firme.

Mas, quando o calendário indicou um mês inteiro de atraso da data que ele deveria ter chegado à Austrália, as autoridades dinamarquesas resolveram dar início às buscas.

Começaram fazendo contato com outros navios que tinham feito aquela rota, na mesma época.

Dois deles, o cargueiro inglês Horatius e o alemão Heidelberg, afirmaram que não havia ocorrido nada de anormal nas suas travessias, sequer tempestades, salvo a presença de um ou outro iceberg distante.

E foi este detalhe – a presença de icebergs na rota, algo, no entanto, já esperado naquelas latitudes tão ao sul – que ajudaria a tecer a primeira e, até hoje, mais provável explicação para o sumiço do barco dinamarquês e seus infelizes jovens tripulantes.

De acordo com os defensores da tese de colisão com um iceberg, o Kobenhavn, tal qual o Titanic, 16 anos antes, teria atingido com tamanha violência um imenso bloco de gelo, muito possivelmente quando navegava à noite, que seu naufrágio poderia ter sido instantâneo – tão rápido que não teria dado tempo sequer de enviar um pedido de socorro pelo rádio de longo alcance.

A mesma explicação caberia para justificar o não pedido de socorro também no caso da segunda hipótese levantada para o desaparecimento do gigantesco barco: a de que fortes ventos vindos da Antártica o tivessem feito capotar e afundar.

Mesmo assim, considerando que o mar subantártico é um dos mais remotos do planeta, o que dificultaria a visualização de eventuais vestígios e náufragos pelos demais navios, mas que a região, embora erma, possui algumas ilhas, para onde os sobreviventes poderiam ter seguido em botes salva-vidas, os dinamarqueses deram início a uma grande operação de busca em toda a região.

De certa forma, o orgulho do país estava em jogo.

Bem como a vida de meia centena de jovens adolescentes.

O desaparecimento misterioso do Kobenhavn chocara a Dinamarca.

E o mundo.

Imediatamente, navios foram despachados para reconstituir a rota completa da viagem do grande veleiro e visitar todas as ilhas inóspitas e desabitadas ao sul dos oceanos Atlântico e Índico, como Goughm, Kerguelen, St. Paul, Prince Edward, Amsterdam e Crozet – esta, considerada um dos locais mais remotos da Terra.

Mas nada foi encontrado.

Mesmo nas ilhas onde haviam “depósitos para náufragos”, abrigos construídos para eventuais sobreviventes de naufrágios, os estoques de alimentos lá deixados seguiam intactos.

Nenhum tripulante do Kobenhavn chegara a nenhuma delas.

Isso era certo.

Mas o que ninguém sabia explicar era por que nenhum vestígio do enorme barco surgia no mar.

Os dinamarqueses não aceitavam que uma embarcação robusta e grandiosa como aquela pudesse ter sido simplesmente engolida pelo mar – de certa forma, a mesma soberba que vitimara o Titanic, anos antes.

Isso, no entanto, poderia ser explicado por uma metódica e obsessiva rotina que havia a bordo do Kobenhavn: a de manter tudo bem preso e amarrado.

Especialmente naquela rota, sabidamente sujeita a fortíssimos ventos.

Mais tarde, esse procedimento seria confirmado pelo cadete que só escapou com vida do naufrágio porque voltou para casa um dia antes da partida do barco de Buenos Aires.

Durante um par de meses, as buscas pelo veleiro desaparecido levaram as equipes a locais que, até então, jamais haviam sido visitados.

Mas não nenhum vestígio do barco ou dos seus infelizes ocupantes foram encontrados.

Começaram, então, a surgir boatos e pistas falsas por todos os lados.

Em abril de 1929, uma notícia chegou aos ouvidos das autoridades navais dinamarquesas.

Um missionário inglês garantia ter visto um grande veleiro, “de cinco mastros”, navegando erraticamente próximo à ilha de Tristão da Cunha, no dia 21 de janeiro daquele ano.

A data batia com período em que o Kobenhavn sabidamente navegava no Atlântico Sul, já que era a mesma daquele contato, via rádio, com o cargueiro norueguês William Blumer.

Mas o barco em questão, não.

Naquela data, o barco que o missionário viu nas imediações de Tristão da Cunha era o também grande veleiro finlandês Ponape, que chegou à ilha exatamente naquele dia, como comprovaram, mais tarde, os registros de navegação do barco.

Mas a prova definitiva de que não se tratava do Kobenhavn veio de um detalhe inquestionável: o Ponape possuía apenas quatro mastros – e não cinco, como equivocadamente contara o missionário.

Nos meses subsequentes, novas pistas não confiáveis seguiram pipocando nas mais diferentes regiões.

A última investigação foi a de um estranho bote encontrado em uma praia deserta da costa sudoeste da África do Sul, com alguns esqueletos humanos.

Uma equipe foi enviada ao local, mas ficou constatado que, pelo tipo de embarcação, aquele bote nada tinha a ver com o Kobenhavn – embora jamais se tenha sabido a quem pertenceram aquelas ossadas.

As buscas seguiram por quase um ano, até que o governo da Dinamarca, resignado, declarou o Kobenhavn como oficialmente perdido.

E um inquérito foi instaurado.

Mas sua conclusão, após meses de análises e audiências, especialmente com o cadete que escapou por pouco de desaparecer também, foi a mesma que todo velho marinheiro sabia desde o início: o mar havia engolido o grande barco, sem deixar nenhuma pista, gerando um mistério que se tornou eterno: o que será que aconteceu com o maior veleiro do início do século passado?

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