Há anos, um tenso conflito acontece ao longo da grande faixa limite do mar territorial da Argentina.

De um lado, estão centenas de barcos pesqueiros – chineses, na sua maioria.

Do outro, alguns poucos navios de patrulha da Prefectura (uma espécie de Guarda Costeira) Argentina.

E a razão do embate é a pesca ilegal de uma espécie de lula, que só existe ali.

Tal qual lobos à espreita da presa, os pesqueiros infratores ficam brincando de gato e rato com a fiscalização argentina, parados rentes à linha imaginária que separa o mar territorial daquele país das chamadas Águas Internacionais, onde os argentinos não podem agir.

Mas, sempre que a fiscalização se afasta, os pesqueiros voltam a invadir o mar argentino e a capturar o precioso molusco.

É uma caçada interminável – quase como tentar enxugar gelo.

Uma guerra que os argentinos tentam combater 24 horas por dia, quase sempre sem nenhum sucesso.

Mas, de vez em quando, conseguem uma vitória.

Foi o que aconteceu na madrugada de 15 de março de 2016, a cerca de 600 quilômetros da costa argentina, mas ainda dentro dos limites do mar territorial do país.

Naquele dia, a habitual perseguição dos navios de patrulha aos barcos infratores terminou da maneira mais radical possível: com o metralhamento e afundamento de um deles: o pesqueiro chinês Lu Yan Yu Yuan 010, que tinha 32 homens a bordo.

Nenhum dos tripulantes nada sofreu no episódio e todos foram resgatados no mar.

Quatro deles, incluindo o comandante do pesqueiro invasor, pela própria tripulação do navio argentino que os atacou, o Prefecto Derbes.

Os restantes, por outros barcos chineses que estavam nas imediações, fazendo a mesma coisa que o Lu Yan Yu Yuan 010 – ou seja, a pesca ilegal.

Mas a ação teve lances de filmes de ação.

Começou com um avião argentino de patrulha localizando o pesqueiro invasor e avisando o comandante do Prefecto Derbes, que estava ali por perto.

Cumprindo o protocolo, o navio alertou o barco, pelo rádio, em inglês e espanhol, de que ele estava atuando em águas da chamada Zona de Exclusão, onde não é permitida a atividade pesqueira de barcos estrangeiros – como se isso fosse algo que os infratores não soubessem.

Como não houve nenhuma resposta, os argentinos passaram a emitir sinais sonoros e luminosos, que significavam a mesma coisa – também ignorados pelos chineses.

A única reação do barco invasor veio em seguida, quando todas as suas luzes foram apagadas, bem como o sinalizador automático da embarcação, e o pesqueiro iniciou a fuga, rumo ao abrigo seguro do outro lado da linha divisória.

Mas não conseguiu chegar lá.

Irritados, os oficiais argentinos, que também já haviam dado ordens para os chineses deterem o movimento a fim de serem abordados, partiram no encalço do barco fugitivo.

A perseguição durou um par de horas, com o navio argentino cada vez mais próximo do Lu Yan Yu Yuan 010, já quase camuflado pela escuridão da noite.

Quando a distância foi reduzida a uma centena de metros, os argentinos passaram a executar disparos intimidatórios com fuzis, visando, no entanto, apenas as partes “neutras” do barco chinês, como a proa, onde não havia pessoas, e antenas, a fim de cortar as comunicações com outros barcos invasores, já que a atuação em grupo é uma maneira que invasores usam para dificultar as ações de repressão.

Como nem assim os chineses diminuíram a marcha, a ordem seguinte foi para substituir os disparos de fuzis por rajadas de metralhadoras, que fizeram um grande estrago no barco – que, por fim, parou.

Mas não por muito tempo.

Logo, o Lu Yan Yu Yuan 010 começou a avançar, de ré, na direção da proa do navio argentino, numa clara intenção de provocar uma colisão.

A batida só não ocorreu porque o Prefecto Derbes foi manobrado rapidamente e escapou a tempo.

Mas, àquelas alturas, já estava claro que aquele embate, desta vez, não terminaria bem.

Como, de fato, não terminou.

Após a frustrada tentativa de provocar a colisão entre os dois barcos (através do choque da popa do Lu Yan Yu Yuan 010 com a proa do Prefecto Derbes, o que, depois, permitiria aos chineses alegar que a batida havia sido provocada pelo navio argentino, e não o contrário), o pesqueiro começou a adernar, num claro sinal de que estava prestes a afundar.

Quando a água atingiu a altura do convés, o comandante do pesqueiro e seus 31 subordinados embarcaram em pequenos botes e foram para o mar, de onde foram resgatados em seguida.

Dali, o capitão chinês seguiu direto para a prisão, onde ficou até o caso se tornar uma questão, também, diplomática, porque a China passou a alegar que o Lu Yan Yu Yuan 010 afundara em consequência de ter sido intencionalmente metralhado pelos argentinos.

Já o comandante do Prefecto Derbes negou com veemência, porque os disparos que autorizara não seriam suficientes para afundar um barco com casco de aço de 66 metros de comprimento, sobretudo porque foram feitos sempre acima da linha d´água.

A suspeita, jamais comprovada, mas amplamente aceita até hoje, é que, para incriminar mundialmente os argentinos por ação belicosa e forçar a diminuição do patrulhamento na região através da pressão mundial, os tripulantes do Lu Yan Yu Yuan 010 tenham aberto propositalmente as válvulas do casco do seu próprio barco e o deixado encher de água, antes de abandoná-lo – razão pela qual todos se salvaram, já que tiveram tempo suficiente para preparar a própria evacuação.

Se foi realmente isso o que aconteceu, só mesmo os 32 tripulantes do Lu Yan Yu Yuan 010 saberiam responder.

Mas, como bons infratores, eles jamais se manifestaram.

E a guerra pela captura da cobiçada lula argentina segue até hoje.

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