Na madrugada do último dia 5 de agosto, o casal paulista de aposentados Wladimir e Rosane Popoff, de 65 e 62 anos de idade, respectivamente, viveu o segundo grande susto da vida.

O primeiro foi quando, ainda jovem, o então engenheiro Wladimir trabalhava em uma plataforma de petróleo em alto-mar que pegou fogo, e ele escapou por bem pouco.

Traumatizado com o acidente, que por muito pouco não lhe custou a vida, Wladimir, muito mais conhecido pelo apelido Voka, prometeu a si mesmo que, quando se aposentasse, realizaria um velho sonho do casal: venderia a casa de classe média na qual viviam, em São Paulo, comprariam um veleiro e iriam morar nele.

E foi justamente com o barco que virou a sua casa, quando os dois se aposentaram, que veio o segundo grande susto do casal, na madrugada do último dia 5 de agosto.

Quando navegavam entre as cidades de Caravelas e Ilhéus, na costa sul da Bahia, uma rede de pesca não sinalizada enganchou e danificou o casco do veleiro do casal, o veleiro Darwin, de 40 pés de comprimento.

E, horas depois, eles acabaram afundando, a cerca de 7 milhas náuticas do litoral de Porto Seguro.

Wladimir e Rosane foram resgatados por pescadores e nada sofreram, além do susto e de um grande prejuízo – porque o seguro pagará apenas metade do que o barco valia.

Além disso, agora, eles correm o risco de ter um prejuízo ainda maior, porque, pelas regras da Marinha, os donos de embarcações naufragadas são responsáveis por resgatá-las, a fim de não comprometer a navegação nem poluir o meio ambiente – a menos que nem uma coisa nem outra seja afetada.

“Estamos aguardando a decisão de uma empresa especializada se precisaremos ou não tirar o nosso barco do fundo do mar. Tomara que não, porque nem temos dinheiro para pagar pelo serviço”, diz o casal, que, a seguir, conta como tudo aconteceu.

O relato dos náufragos

“Na manhã do dia 4 de agosto, partimos de Caravelas, rumo a Ilhéus, tão logo o dia amanheceu.

Nosso objetivo final da viagem era Recife.

Costumávamos ter hóspedes em cada trecho da travessia.

Mas, desta vez, seríamos só nós dois no barco.

Mais tarde, daríamos graças a Deus por não haver mais ninguém a bordo.

Muitas horas depois, por volta das quatro da tarde, quando estávamos na metade da travessia, navegando na altura de Porto Seguro, vimos uma caixa de isopor boiando no mar, bem na frente do nosso barco.

Era uma espécie de boia, deixada por pescadores – um sinal de que ali havia uma rede de pesca.

Mas, ao contrário do habitual, não havia uma segunda boia indicando onde a rede terminava.

Por precaução, mudamos o rumo do barco e passamos a mais de 100 metros de distância de tal boia.

Não adiantou.

Mesmo passando longe, sentimos um tranco no barco e deduzimos que havíamos enganchado na rede.

Estávamos acostumados a esse tipo de problema – bem frequente na costa brasileira, por sinal.

Bastava parar o barco, soltar a rede e seguir em frente.

Mas aquela rede era diferente.

Em vez de simples cabos de náilon, os dela eram de aço.

E o choque do barco com o metal danificou o mecanismo interno do nosso leme.

Mas só descobriríamos isso horas depois.

E da pior maneira possível.

Quando vimos que era um cabo de aço que sustentava a rede, paramos o barco e examinamos as partes submersas do casco, para ver se algo havia sido afetado.

Aparentemente, estava tudo em ordem.

Não havia vazamentos, nada quebrado e o leme respondia normalmente aos movimentos.

Aliviados, seguimos em frente.

Por mais um bom tempo.

Até que, quatro horas depois, quando já havia escurecido e o mar ganhara muitas ondas desencontradas, uma tampa do assoalho do barco foi arrancada por um jato d´água, vindo da parte de baixo do casco.

Na hora, custamos a entender o que tinha acontecido. Mas pegamos uma lanterna e corremos para ver de onde vinha aquela água.

Era uma rachadura no casco, causada pelo mecanismo do leme, que, já completamente solto, batia furiosamente contra a fibra de vidro.

E logo a rachadura virou um rombo.

E por ele passou a jorrar um turbilhão de água salgada para dentro do barco.

Tentamos conter a inundação, enfiando no buraco a única coisa que estava à mão: um simples casaco.

Mas era impossível conter a enxurrada.

Corremos, então, um para cada lado.

Um para o leme, na esperança que ele ainda funcionasse – único meio que tínhamos para tentar chegar em águas mais rasas e encalhar o barco, antes que ele afundasse – e outro para o rádio, a fim de pedir socorro.

Nem uma coisa nem outra funcionou.

Nenhum barco respondeu aos nossos pedidos de socorro, e, após um tempo, o leme do nosso veleiro passou a girar descontrolado, completamente solto.

Mesmo assim, conseguimos levar o barco para mais perto de terra firme.

Mas, quando ainda faltavam sete milhas, o leme soltou de vez e a inundação se tornou incontrolável.

Ficamos, então, com o barco sendo rapidamente inundado, sem conseguir movimentá-lo e sem ninguém para nos socorrer.

Era o fim.

Hora de abandonar o barco, com tudo o que havia dentro dele – ou seja, a nossa casa inteira -, e tentar salvar nossas vidas.

Na escuridão e com as ondas cada vez mais fortes, só deu tempo de pegar uma mochila que mantínhamos sempre pronta, para situações de emergência, o motorzinho de popa para o bote e um cacho de banana, que estava pendurado do lado de fora do barco.

Elas serviriam de alimento, já que não sabíamos quanto tempo ficaríamos no mar, até sermos resgatados.

Se é que isso aconteceria…

Rapidamente, o mar invadiu todo o barco.

Nossa última imagem foi a do veleiro que nos serviu de casa nos últimos sete anos afundando lentamente, com as luzes ainda acesas – uma terrível sensação de perda.

Não pelo barco em si, mas pelo que ele representava para nós.

O barco era a nossa casa e, também, nossa principal fonte de renda.

De uma só vez, perdemos tudo.

Quando não restava mais nenhuma parte do casco na superfície, olhamos ao redor e não também não vimos nada.

Só a escuridão do mar, permanentemente sacudido pelas ondas.

Estávamos encharcados, levando pancadas de água por todos os lados, e a mais de 12 quilômetros da costa – longe demais para enxergar algo.

Nem mesmo as luzes de Porto Seguro, ao longe.

Quase por instinto, escolhemos uma direção a seguir e ligamos o motorzinho do bote.

Enquanto um chorava, o outro custava a acreditar que aquilo estivesse mesmo acontecendo.

Tempos depois, vimos uma luzinha no mar, que julgamos ser um farol.

Não era.

Era um barco de pescadores.

Nos aproximamos, rapidamente.

Eles estavam dormindo, mas acordaram assustados, com nossos gritos de socorro.

Fomos puxados para dentro do barco e ganhamos camas para descansar.

Eram três da madrugada, estávamos esgotados, mas era impossível pegar no sono.

A imagem do barco inundando e afundando não saia das nossas mentes.

Os pescadores sugeriram interromper a viagem e nos levar direto para Porto Seguro.

Recusamos.

Eles estavam trabalhando e ainda tinham redes a recolher.

Ironicamente, redes de pesca – como as que haviam causado o nosso drama.

Chegamos a Porto Seguro só quando o dia estava amanhecendo e apenas com uma mochila e um cacho de bananas.

Todo o resto das nossas coisas (barco, casa, roupas, pertences, tudo, tudo, tudo) agora jazia no fundo do mar.

E, se depender apenas da nossa vontade, é por lá que devem ficar.

Resgatar o barco custará um valor que não temos mais como pagar.

Perdemos o nosso barco, a nossa casa e o nosso emprego – tudo ao mesmo tempo.

Mas estamos vivos.

E isso não tem preço.

Segue a vida…”

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