Entre os muitos horrores que a perseguição aos judeus na Segunda Guerra Mundial produziu não escaparam nem as tentativas de fuga pelo mar.

E quase todas frustradas, porque, além dos nazistas, também os oportunistas se aproveitaram do desespero das famílias judias para enriquecer, ludibriando as que tentavam escapar de Hitler.

Foi o que aconteceu no caso do infame navio S.S. Struma, um dos mais tristes exemplos de desdém pela vida humana que a história marítima já produziu.

Em 1941, a perseguição nazista se intensificou ainda mais e uma das saídas para os judeus passou a ser a cidade de Constança, na Romênia, de onde partiam velhos navios, rumo à Palestina.

Mas a maioria deles não passavam de sucatas e eram verdadeiras arapucas marítimas.

Como o S.S. Struma.

Em dezembro daquele ano, atraídos por cartazes com a imagem de um lindo transatlântico e que anunciavam “uma viagem luxuosa para a Terra Prometida”, 779 judeus de famílias abastadas pagaram pequenas fortunas por aquele tipo de fuga.

Mas ao chegarem ao porto, o que encontraram foi um decrépito cargueiro, construído no final do século anterior, sem a menor condição de navegar — um “navio-caixão”, como os inescrupulosos armadores da época chamavam os barcos já condenados, mas que a guerra ressuscitara.

Eles protestaram, mas o responsável pelo barco alegou que aquele era apenas o transporte até o verdadeiro transatlântico, que estava aguardando os passageiros fora do porto, porque era grande demais para atracar.

Mentira, claro.

Mesmo assim, eles embarcaram.

Até porque não tinham escolha.

Antes disso, todos os passageiros tiveram suas bagagens confiscadas, sob a desculpa de que as malas seguiriam depois, em outro barco, para não superlotar o S.S. Struma. Obviamente, também não era verdade.

Mas o pior — bem pior — ainda estava por vir.

Uma vez em alto mar, como esperado, além de não haver transatlântico algum no aguardo dos coitados, o velho navio passou a apresentar um defeito após o outro.

Logo no primeiro dia, o motor quebrou e o comandante teve que pedir socorro.

Um barco romeno veio ajudar, mas, em troca de ajuda, exigiu que os passageiros entregassem alianças, anéis e relógios.

Um verdadeiro saque.

O Struma voltou a navegar, mas precariamente.

A cada meia hora de travessia, desligava os motores e os deixava esfriar, por três horas.

Até que, perto de Istambul, na Turquia, quebrou novamente.

Desta vez, foi rebocado até o porto da cidade.

E lá começou o martírio dos judeus que estavam a bordo.

Como a Palestina estava sob a responsabilidade da Inglaterra, e como os ingleses temiam uma invasão descontrolada da região, eles convenceram as autoridades turcas a reter o navio no porto, alegando que seus passageiros não tinham vistos de entrada para onde seguiam e, também, como uma forma de desestímulo aos outros navios do mesmo tipo, que tinham o mesmo destino.

A bordo do S.S Struma, do qual ninguém podia desembarcar, a situação logo se tornou insuportável.

Não havia água nem comida, embora ele estivesse atracado no porto da capital turca.

E passou a ser servida apenas uma refeição quente não por dia e sim por semana.

Rapidamente, o único banheiro do navio teve que ser interditado, por questões sanitárias.

No porto de Istambul, o S.S. Struma transpirava fedor e horror.

Depois de muitos dias e longas negociações, foi permitido o desembarque de apenas uma mulher, que estava dando a luz a bordo, e de quatro judeus que já tinham vistos para a Palestina.

Mas ficou decretado que o Struma não voltaria a navegar – até porque os turcos haviam se recusado a fazer os reparos que o navio necessitava.

A agonia durou dez horripilantes semanas, ou dois meses e meio, até que, no 71º dia de espera no porto, num gesto ainda mais cruel que o dos ingleses, o governo turco decidiu cortar as amarras do S.S. Struma e expulsá-lo dali, com sua “carga humana”, mesmo ele não tendo como navegar por meios próprios.

Um rebocador arrastou o navio até a saída da baía e o deixou lá, inerte, à deriva, entregue à própria sorte.

Nas amuradas do navio condenado, os passageiros pediam socorro.

Em vão.

Como eram tempos de guerra e os submarinos alemães patrulhavam àquelas águas com rigor implacável, o final daquela história era tão previsível quanto abominável.

E foi justamente o que aconteceu.

Sem conseguir se locomover, muito menos se esconder, o S.S. Struma não durou mais do que uma noite no mar.

Virou alvo fácil para os torpedos de um submarino nazista e explodiu por inteiro, afundando em seguida.

Dos 774 passageiros que restavam a bordo (entre eles 103 crianças), apenas um sobreviveu – porque foi encontrado, por acaso, no dia seguinte, boiando na água, por um barco pesqueiro.

E embora a explosão tenha sido vista da própria Istambul, nenhum tipo de socorro foi enviado ao local.

Ironicamente, no dia seguinte, chegou à Turquia uma burocrática autorização inglesa para que as crianças do S.S. Struma fossem desembarcadas.

Mas já era tarde demais.

A guerra havia produzido mais uma brutal barbaridade.

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