No início do século 19, quando todas as viagens entre Europa e Estados Unidos só podiam ser feitas pelo mar, uma vez que os aviões ainda não tinham sido inventados, alguns donos de empresas marítimas inglesas decidiram criar uma espécie de prêmio, a ser dado ao navio de transporte de passageiros que fizesse a travessia entre os dois continentes com a maior velocidade – mas não necessariamente o que a fizesse em menos tempo, porque isso dependeria das diferentes rotas escolhidas.

Era pura jogada de marketing – claro -, numa época em que isso nem havia sido inventado.

O objetivo era atrair passageiros, usando a capacidade de navegar rápido dos seus barcos, na época, ainda com cascos de madeira e movidos a vapor, com grandes pás laterais em vez de hélices.

O prêmio escolhido foi simbólico, inspirado nas corridas de cavalo: uma flâmula azul (“Blue Ribbon”, em inglês), que, no entanto, só foi utilizada na sua forma física, pendurada no mastro principal, no início do desafio, sendo depois substituída por um troféu.

Já a disputa – no fundo, uma corrida de grandes navios transatlânticos de um lado a outro do oceano, com centenas de pessoas a bordo -, dividida em dois percursos: o de ida, no sentido leste-oeste, entre Inglaterra e Estados Unidos, contra o fluxo da Corrente do Golfo, e o de volta, a favor dela, portanto, mais veloz.

Como a regra também determinava que apenas as empresas que oferecessem serviços regulares – e não esporádicos – de travessia do Atlântico Norte poderiam participar da disputa, o primeiro navio a se inscrever foi o Great Western, da companhia inglesa do mesmo nome, seguido pelo Sirius, da British & American Company, duas das maiores da época.

Em 4 de abril de 1838, o Sirius partiu do porto irlandês de Cork, com destino a Nova Jersey, disposto a navegar o mais rápido possível e se tornar o primeiro detentor do prêmio.

E conseguiu, depois de chegar a queimar partes do próprio barco para alimentar as caldeiras e assim aumentar sua velocidade.

Dezoito dias depois, o Sirius chegou aos Estados Unidos, com uma média horária de 8,03 nós (14,8 km/h), durante toda a travessia – o primeiro recorde da Blue Ribbon.

Mas a alegria da British & American Company durou pouco.

No dia seguinte, o Great Western, que havia zarpado do porto inglês de Avonmouth quatro dias após o Sirius deixar a Irlanda, tocou o porto de Nova York e derrubou a marca do concorrente, com pouco mais de meio nó acima de velocidade média: 8,66 nós – cerca de 15 km/h.

O recorde do Sirius durou apenas um dia.

Mas a disputa e a repercussão que isso teve no mercadp, levou as outras empresas a investirem na agilidade de seus navios, para que eles ficassem cada vez mais velozes – mesmo que isso implicasse em recorrer também a velas, para ajudar a impulsioná-los.

Logo, todas as empresas marítimas que exploravam a rota Europa-Estados Unidos queriam ter aquela flamula azul tremulando no mastro de seus barcos, um incontestável atestado de que não havia outro navio tão veloz na travessia do Atlântico Norte.

Isso significava mais passageiros interessados em viajar nele.

Portando, além de prestígio, mais dinheiro.

Ao longo dos primeiros cinco anos de existência da Blue Ribbon, o Great Western dominou a disputa, tornando-se, inclusive, o primeiro navio a superar a marca de 10 nós (18,5 km/h) de velocidade média – um espanto para a época.

Mas, depois disso, a posse do cobiçado prêmio passou a ser domínio quase que exclusivo das duas maiores empresas do setor, as inglesas Cunard e White Star, esta particularmente famosa, já que lançaria, alguns anos depois, o Titanic, que, apesar de igualmente veloz, privilegiava o luxo, não a velocidade, embora também ambicionasse a Blue Ribbon – só não teve tempo de conquistá-la, porque afundou antes de terminar sua primeira viagem.

Quando isso aconteceu, a posse da Blue Ribbon já havia adquirido um caráter também político – virou uma espécie de competição paralela de poder entre a Inglaterra e os demais países da Europa, pelo status de possuir o navio de passageiros mais veloz do mundo.

A rivalidade se acirrou ainda mais quando a Alemanha anunciou, no final da segunda metade do século 19 (quando os navios transatlânticos já utilizavam hélices e cascos de aço, o que fez a velocidade da travessia dar um salto, passando dos 20 nós (37 km/h) de média) que entraria na disputa pela fita azul com o seu principal transatlântico: o Deutschland – que não só conquistou a flamula logo em seguida, como a manteve por três anos, na primeira década do Século 20.

Preocupado com o sucesso alemão em um setor – a navegação transatlântica para a América – que a Inglaterra sempre havia dominado, o governo inglês decidiu financiar a construção de dois super-transatlânticos para a empresa Cunard: o Lusitania e o Mauretania.

Em 1906, eles foram lançados. E o sucesso foi imediato.

O Lusitania (que, mais tarde, seria afundado por um submarino alemão na Segunda Guerra Mundial, gerando uma catástrofe, que, para muitos, levou os Estados Unidos a entrar no conflito) conquistou a Blue Ribbon logo no ano seguinte.

Mas, dois anos depois, a perdeu para o Mauretania, que manteve o prêmio por nada menos que 20 anos, consolidando a supremacia dos navios da Cunard – bem como da Inglaterra, dona de 25 dos 35 transatlânticos que tiveram a honra de ostentar a Blue Ribbon, ao longo da sua história.

Apesar da supremacia inglesa, o início do Século 20 foi a fase áurea da disputa pela Blue Ribbon, com transatlânticos italianos, americanos e franceses entrando também na disputa.

Mais do que um simples prêmio pela performance excepcional, a Blue Ribbon indicava que o seu possuidor era um navio superior aos demais.

Em todos os aspectos. Inclusive na sofisticação.

Dois deles fizeram história por isso.

O primeiro foi o transatlântico francês Normandie, considerado “o mais glamouroso de todos os tempos”.

O outro, o igualmente majestoso Queen Mary, um dos navios mais icônicos da Inglaterra.

Em meados da década de 1930, eles protagonizaram um empolgante duelo pela posse do título de mais veloz do Atlântico.

O Normandie conquistou isso logo na sua viagem inaugural, em maio de 1935, chegando à Nova York com a estupenda média horária de 29,9 nós – pouco mais de 55 km/h.

Mas perdeu o recorde para o Queen Mary no ano seguinte, quando o transatlântico inglês quebrou a barreira do 30 nós.

Um ano depois, em julho de 1937, o Normandie recuperou a Blue Ribbon, cruzando da Inglaterra para os Estados Unidos à uma velocidade média de 30,5 nós.

Mas o Queen Mary resgatou, novamente, a honra inglesa no ano seguinte, com 31 nós – e fez o mesmo no caminho de volta, quando ultrapassou sua própria marca.

Ano após ano, aqueles dois estupendos transatlânticos foram superando um ao outro, até que um incêndio, em fevereiro de 1942, quando estava atracado no porto de Nova York, sendo preparado para o transporte de tropas para os campos de batalha da Segunda Guerra Mundial, provocou o fim do Normandie.

Por mais dez anos, a Fita Azul do Atlântico ficou em posse do Queen Mary, que também fora requisitado para o transporte de tropas na guerra, mas voltara à linha regular após isso.

Mas, em julho de 1952, apesar do declínio nas travessias oceânicas causado pelo surgimento dos voos comerciais Europa e Estados Unidos, sua marca foi trucidada pelo último grande transatlântico a operar regularmente a rota entre Inglaterra e Nova York: o ágil navio americano USS United States, que alcançou a impressionante média horária de 34,5 nós (perto de 64 km/h).

E ele foi ainda mais rápido na volta, com 35,5 nós, ou quase 66 km/h.

Nenhum outro navio jamais havia navegado tão rápido nas águas do Atlântico Norte.

Como, pelos critérios da Blue Ribbon, só participariam da disputa navios de passageiros de linhas regulares entre Europa e Estados Unidos, o recorde estabelecido pelo USS United States, em 1952, ficou para sempre, porque esse tipo de viagem já não existe mais – o que também decretou o fim do prêmio em si.

Restou apenas o termo “Fita Azul”,  usado até hoje para premiar os barcos mais velozes em competições náuticas.

De lá para cá, porém, travessias ainda mais velozes do Atlântico Norte ocorreram.

Mas nenhuma feita por um gigantesco transatlântico abarrotado de passageiros, em uma improvável corrida oceânica, como a posse da cobiçada Blue Ribbon fez acontecer.

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