Seis anos atrás, quando eclodiu a guerra civil no Iêmen, que se arrasta até hoje, os rebeldes da etnia Houthi tomaram algumas áreas do pais, incluindo a capital, Sana, bem como o litoral norte do pais, onde além de portos importantes para o escoamento do petróleo da região, havia um enorme navio petroleiro desativado, que pertencia ao governo e havia sido transformado em deposito flutuante de óleo cru.
De lá para cá, quase nada mudou no conflito, inclusive a situação do navio confiscado, o FSO Safer, que segue em poder dos houthis e ainda abarrotado com 157 000 toneladas de petróleo bruto – uma carga avaliada em mais de 70 milhões de dólares.
Mas, sem nenhuma manutenção desde então, o ex-superpetroleiro vem se deteriorando rapidamente e, no momento, representa o maior risco gerado por aquele conflito: o do vazamento de todo o seu conteúdo no mar, o que geraria uma catástrofe ambiental sem precedentes na região.
A situação é ainda mais dramática porque, além de não terem recursos para reparar os danos que a corrosão e a falta de manutenção vêm causando ao casco do navio, os houthis não permitem que técnicos enviados pelas Nações Unidas inspecionem o SFO Safer, alegando que a instituição não é confíavel.
E ainda ameaçam explodir o navio com disparos, caso qualquer intervenção seja feita sem a autorização deles.
Recentemente, a casa de máquinas do navio transformado em depósito flutuante foi invadida pelo mar, devido ao estado precário do casco e o não funcionamento das bombas de sucção, o que aumentou ainda mais o risco de um naufrágio.
Além disso, há o permanente risco de autoexplosão do navio, por conta do acumulo de gases gerados pelo óleo retido no seu interior, já que, sem geradores nem manutenção, os exaustores de gases do SFO Safer também não funcionam mais.
Se isso ou o simples naufrágio do navio acontecer, os danos ao meio ambiente do Mar Vermelho, um dos maiores redutos de corais ainda saudáveis do planeta, seriam catastróficos, porque, desde que caiu nas mãos dos rebeldes, os 34 tanques do SFO Safer estão até a boca de petróleo não refinado. E sem nenhum cuidado na manutenção do produto.
Só para ter uma ideia dos danos que o vazamento do petróleo que há no interior do navio poderia causar, basta dizer que ele contém quatro vezes mais óleo cru do que havia nos tanques do petroleiro Exxon Valdez, causador de uma das maiores tragédias ambientais da História, quando encalhou na costa do Alasca, em 1989.
Também recentemente, imagens de satélites mostraram preocupantes manchas no mar no entorno do navio moribundo, que podem ser indícios de que os vazamentos já estão ocorrendo.
Os houthis também usam o navio-bomba como forma de pressão contra o governo do Iêmen, que, por sua vez, reclama seus direitos sobre o petróleo que há dentro dele, já que a quantidade do produto corresponde a uma pequena fortuna.
Apesar das tentativas de negociações intermediadas pelas Nações Unidas, tanto na questão do conflito quando do próprio navio, os diálogos não estão surtindo efeito, para preocupação geral da comunidade mundial.
Em julho último, houve até uma reunião especial para tratar do assunto, na sede da ONU, mas, uma vez mais, não deu em nada.
Enquanto isso, a guerra civil continua a assolar o Iêmen e impede ações mais concretas para tentar salvar o navio, ou, ao menos, retirar o petróleo que há dentro dele.
“Comercialmente falando, não há mais esperanças de recuperar o petroleiro, porque o que ele vale já é menos do que custaria para reformá-lo”, diz um especialista no assunto. “E dinheiro é uma questão crucial neste caso, para os dois lados”, completa.
O SFO Safer (algo como “Seguro”, em inglês, nome que não deixa de ser irônico para um navio cuja espessura do casco pode estar resumida a milímetros, por conta da corrosão marinha), tem 362 metros de comprimento, 70 metros de largura, e foi construído no Japão, em 1976, como um dos maiores petroleiros da época.
Em 1988, foi vendido ao governo do Iêmen, que o transformou em depósito flutuante, e foi permanentemente ancorado a sete quilômetros da costa, nas proximidades do porto de Ras Issa.
Mas hoje, décadas depois, já é considerado obsoleto, situação agravada pela falta de manutenção nos últimos cinco anos e meio, desde que caiu nas mãos dos rebeldes houthis.
Mas há esperanças de que o pior não aconteça.
“Cedo ou tarde, os houthis vão ter que colaborar com as Nações Unidas, porque não terão como evitar a responsabilidade se algum vazamento de petróleo acontecer, o que pode representar até o fim do movimento”, acredita um cientista político.
Enquanto isso, porém, os ambientalistas seguem de cabelo em pé pelo risco que representa um superpetroleiro com 34 tanques abarrotados de petróleo, nas mãos de um grupo de fanáticos xiitas, capazes de transformar a guerra civil do Iêmen em uma, também, catástrofe ambiental.
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