Só os jornais da época, alguns livros de história e os brasileiros com um pouco mais de 100 anos de idade se recordam.
Mas, pouco mais de um século atrás, mais precisamente em 1918, o Brasil – e o mundo – enfrentou outra pavorosa e trágica pandemia causada por um vírus respiratório: a chamada “gripe espanhola”, que matou cerca de 50 milhões de pessoas – cerca de 35 000 delas no Brasil, embora este número não seja muito confiável, incluindo então Presidente eleito, Rodrigues Alves, que nem chegou a tomar posse.
Mas, naquela época, o vírus, que hoje é conhecido como influenza e que ainda causa vítimas esporádicas, não chegou ao Brasil embutido no organismo de passageiros de aviões, até porque eles ainda estavam sendo inventados, mas sim a bordo de um único navio: o transatlântico inglês Demerara, que chegou ao porto de Recife, vindo da Inglaterra e Portugal, em 14 de setembro de 1918.
Os brasileiros não sabiam, já que as comunicações na época eram precárias demais, mas o terror estava chegando ao solo brasileiro junto com aquele transatlântico.
Duas passageiras morreram durante a própria viagem e outras pessoas que estavam no navio já chegaram doentes a Recife.
Mesmo assim, como ninguém aqui sabia sobre o surto que já assolava a Europa, então às voltas com a Primeira Guerra Mundial, nenhuma precaução foi tomada.
Mesmo na Europa e nos Estados Unidos, de onde se imagina partiu aquele vírus, que, em seguida, foi levado para os campos de batalha pelos soldados, não havia conhecimento do problema.
Os líderes dos países em guerra omitiam isso das tropas, para não desanimar os combatentes.
A única exceção foi a Espanha, que por ser neutra naquele conflito, passou a noticiar nos jornais as mortes em massa entre os soldados, razão pela qual a epidemia se tornaria conhecida como Gripe Espanhola, já que só aquele país a noticiava.
No Brasil, imediatamente após a chegada daquele navio, que trazia algo bem mais letal do que as armas e munições usadas nos campos de batalha, começaram a pipocar casos da doença, que, tal qual o atual coronavírus, matava as pessoas em poucos dias.
Os primeiros casos foram em Recife. Depois, em Salvador e no Rio de Janeiro, onde o Demerara também fez escalas.
Mas o país só se deu conta do terror que chegara naquele transatlântico, logo apelidado de “Navio da Morte”, quando milhares de pessoas passaram a morrer, de forma quase fulminante.
Rapidamente, os hospitais estraram em colapso, enquanto as autoridades de saúde não sabiam o que fazer para tentar conter a epidemia.
Coube, então, à própria população criar seus próprios “remédios caseiros”, que, obviamente, não funcionaram.
Caldo de galinha, pitadas de tabaco, fumaça de alfazema e sal de quinino, este muito usado em tratamentos de malária, foram alguns dos “medicamentos” ministrados aos doentes.
Mas nenhum teve a popularidade de uma fórmula criada a partir da mistura de cachaça, limão e mel, que tampouco evitou as mortes geradas pela Gripe Espanhola, mas fez nascer a bebida mais típica do Brasil, até hoje: a caipirinha.
A Gripe Espanhola dominou o planeta de agosto de 1918 a janeiro de 1919, deixando, em menos de cinco meses, um macabro saldo de quase seis vezes mais mortes do que na Primeira Guerra Mundial.
Para os brasileiros, nunca antes um simples navio trouxera tamanho pânico.